CÉU: OCEANO DE FELICIDADE

(1 Cor 2, 9)

 

 “O que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram e o coração do homem não percebeu, isso Deus preparou para aqueles que o amam”.

 

 

I. Felicidade do céu

 

A 25 de novembro de 1865 morria santamente aquele anjo de bondade, piedade e caridade que na terra se chamava Margarida Bosco.

Quatro anos mais tarde, quando o santo passava junto à igreja da Consolata, numa esquina da rua, de repente viu diante de si a mãe.

- A senhora por aqui, minha mãe? A senhora não morreu?

- Morri sim, mas estou viva, - respondeu a mãe.

- E a senhora é feliz?

- Felicíssima.

O filho perguntou-lhe, então, se voara ao céu logo depois da morte, e ela respondeu que não. Perguntou-lhe que era das almas de alguns meninos falecidos no Oratório e soube que estavam salvos.

- E, agora, - acrescentou Dom Bosco – conte-me o que a senhora goza no céu.

- Não lhe posso explicar, meu filho.

- E a senhora não pode dar-me uma idéia, fazer-me experimentar ao menos uma gota da sua felicidade?

- Eis! – disse a mãe.

E o santo viu como ela se transfigurou: uma luz esplêndida a envolveu, as suas pobres vestes tornaram-se preciosíssimas, a sua fronte tomou um ar de sublime majestade e de seus lábios irrompeu um canto... Mas que canto! Parecia uma harmonia, uma melodia de mil vozes, ou antes, mil graduações de vozes de uma suavidade tão grande que o filho ficou extasiado. A última saudação da mãe foi:

- Eu o espero no Céu.

 

Católico, lembre-se continuamente de que o Céu existe, ele é nossa Pátria Eterna. O grande número de nossos queridos ali nos espera: pais, irmãos... e deseja estar conosco para sempre a grande multidão já segura de sua salvação, ainda solícita pela nossa. Chegar até eles e a seu abraço, quanta alegria para eles e para nós; que prazer ali, no reino celeste, sem medo da morte, e a vida para sempre; que imensa e inesgotável felicidade!

Não adianta o ateu negar a existência do Céu. Ele existe!

O Céu é a posse de Deus. No Céu contempla-se a Deus, adora-se e ama-se a Ele.

O Céu é o lugar onde Deus habita com os seus Anjos e Santos.

Lá estão em trono diamantino todos os que a Igreja elevou às honras dos altares.

Lá vivem todos os que, a despeito das mil seduções do mundo, conservaram intacta a flor da inocência.

Lá estão gozando da vista de Deus todos os que lavaram nas lágrimas de uma sincera penitência as máculas de sua vida pecaminosa.

O Céu é o reino dos vivos. A graça é a vida da alma; logo, só aqueles que, ao separar-se do mundo, estão em estado de graça e amizade com Deus, lá têm entrada.

Segundo Jesus Cristo, a vida eterna é a casa do Seu Pai, em que há muitas moradas. Cristo foi adiante, e ali espera pelos seus amigos fiéis: “Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se não fosse assim, eu vos teria dito, pois vou preparar-vos um lugar, e quando eu me for e vos tiver preparado um lugar, virei novamente e vos levarei comigo, a fim de que, onde eu estiver, estejais vós também” (Jo 14, 2-3).

No Céu reina, sim, uma felicidade indescritível; mas não os prazeres da vida sensual. É uma felicidade que “nem os olhos viram, nem os ouvidos ouviram, nem passou ao homem pelo pensamento” (1 Cor 2, 9). Esta alegria não é proporcionada aos desejos terrenos. Só logramos imaginá-la muito imperfeitamente; não podemos formar dela um conceito exato. Só o pode ter quem já goza dela na Pátria feliz.

Quem nos fará compreender a beatitude dos santos? Tudo o que Deus criou no universo, as maravilhas da terra, do mar, do firmamento, não nos podem dar uma ideia da beleza e da riqueza do lugar em que habitam. Comparar essa morada aos palácios dos reis, ao templo de Salomão, seria por em paralelo a obra dos homens e a de Deus. Dizer que é uma cidade de príncipes, uma Jerusalém de portas de diamantes, de muralhas de pedras preciosas, seria de certo modo contradizer o apóstolo, que declara que “... ninguém viu, nenhum ouvido ouviu, nenhum coração concebeu o que Deus reserva aos que o amam” (1 Cor 2, 9).

Estas palavras de Is 64,2-3, resumem o conteúdo da sabedoria divina: o conjunto de dons que ultrapassam toda a capacidade humana (Ef 3,19) e que Deus preparou desde toda a eternidade para os que O amam. Estes dons não são senão o amor que Deus tem aos homens.

A tradição cristã, baseando-se em que tais dons se alcançam plenamente na outra vida, considerou estas palavras como descrição do Céu: “Que ditosos e admiráveis são os dons de Deus! Vida imortal, esplendor da justiça, verdade na liberdade, fé confiante, temperança com santidade; e podemos conhecer todas estas coisas. Que mais terá Deus preparado para os que esperam n’Ele? Unicamente o Artífice supremo e o Pai dos séculos o conhece. Esforcemo-nos intensamente por sermos contados entre os que esperam para poder participar dos dons prometidos” (São Clemente Romano, Ad Corinthios, 30). E o Catecismo Romano ensina, por seu lado: “Devem estar persuadidos os fiéis de quantas coisas possa haver agradáveis para nós ou ser desejados nesta vida, quer se refiram à ilustração da alma, quer à perfeição e comodidade do corpo, inundam por todas as partes a vida feliz do Céu, com abundância de todas essas coisas, embora o Apóstolo afirme que isto se verificará por modo mais sublime do que viu olho algum, percebeu o ouvido ou passou pela imaginação de todo o homem” (I, 12, 12).

Lá, diz São João, “... não há luto, nem prantos, nem sofrimentos” (Ap 21, 4). Não há vicissitudes de dia e noite, de frio e calor, de saúde e enfermidade... Tudo lá corre de acordo com os desejos dos detentores desse reino. Abismados no oceano das alegrias divinas, participam da felicidade do próprio Deus, sem temor de a perder jamais. Que mais? Sendo a divindade a felicidade essencial, imutável e eterna, não é sem motivo que dizem incompreensível essa inefável beatitude.

Para dela fazermos alguma idéia, ser-nos-ia necessário reunir tudo o que Deus fez para no-la proporcionar, isto é, a criação, a encarnação, a redenção, a Igreja, a Eucaristia, todos esses prodígios do poder e da caridade incriados. Seria preciso avaliar o mérito das privações, fadigas, sofrimentos, ignomínias do Homem-Deus; contar as penitências e os atos heróicos dos santos, os sacrifícios e os tormentos dos mártires; conhecer minuciosamente a ação incessante da Providência sobre as almas, o trabalho contínuo da graça a seu respeito, os esforços da Igreja para salvá-las, e as lutas que sustenta com os seus eleitos contra o mundo e os demônios açulados para sua perdição. Numa palavra, “... essa beatitude é tão excelente, que dez séculos de fervor no serviço de Deus, não bastariam para nos merecer esse gozo nem que fosse só por poucas horas” (Santo Anselmo).

Católico, se a felicidade do Céu é eterna; por que você corre tão desesperadamente atrás das coisas passageiras da terra? O mundo pode dar-te a verdadeira felicidade? O lixo oferecido pelo mundo pode satisfazer a sua alma imortal?

Lembre-se de que esse Céu dos santos é a nossa Pátria, é a casa de Deus.

“Meu Deus, na expectativa de tal felicidade, eu seria insensato se me não decidisse a abraçar a mortificação dos sentidos, a vencer a minha preguiça e as minhas repugnâncias, e a suportar os enfados, os desgostos e as contrariedades. O meu coração tão terreno, mal se eleva às alegrias puras da virtude e ao desejo da recompensa que será o seu fruto. Inspirai-me, pois, a coragem: 1.° De me lembrar muitas vezes o fim da vida presente tão curta e miserável; 2.° De dirigir para esse fim todos os meus pensamentos e aspirações, toda a minha atividade, todas as minhas lutas e sofrimentos, sem excetuar nenhuma afronta, nenhuma palavra picante, nenhuma falta de atenção e as mil penas deste triste exílio” (Pe. Luís Bronchain).

 

II. A utilidade de nos exercermos na esperança do céu

 

A esperança eleva o nosso espírito ao pensamento dos bens que nos são prometidos e ao desejo de possuí-los um dia. “Quando considero a grande felicidade que se ganha ao morrer, e o pouco que se perde ao perder a vida, não posso deixar de dizer a Deus: Quando será, Senhor, que me tirareis deste mundo para me introduzir na pátria?” (São Gregório Nazianzeno). Tais deveriam ser também os nossos sentimentos.

Santo Agostinho escreve: “Poderíamos de fato, ser admitidos no céu como cidadãos, sem termos gemido sobre a terra como exilados, animados do desejo da eternidade bem-aventurada? E que há de mais apto para nos desapegar desta vida passageira do que esperar uma outra que nunca terá fim? Aqui sofremos, mas lá gozaremos. Eis por que nas enfermidades e doenças dizemos com Jó: Sei que meu Redentor vive, um dia o verei na minha carne e o contemplarei com os meus olhos; é essa confiança que constitui a alegria do meu coração no meio das minhas dores corporais (Jó 19, 25-26)”. Quando nossa alma mergulha na tristeza, ansiedade e desgosto, quando passa pela provação da tentação ou da adversidade, não há melhor animação do que a esperança de ver um dia a Deus na glória, de amá-Lo, louvá-Lo e gozar para sempre de sua felicidade que é infinita.

Para entrar no Céu é preciso passar por muitas tribulações. Pensemos no céu e superaremos todos os obstáculos.

A terra é um lugar de merecimentos, e por isso é também um lugar de sofrimentos. O Céu é nossa Pátria, lá Deus nos preparou o repouso numa eterna felicidade. Passamos pouco tempo neste mundo, mas neste pouco tempo temos muitas dores a sofrer.

Quem vive com o coração “abraçado” com o Céu vence todas as dificuldades

Há algum caráter difícil, alguma pessoa cheia de defeitos, preconceitos, antipatias... de que Deus se serve para exercer-vos na paciência, abnegação e espírito de sacrifício? Ou então é para vós pesada a companhia dos maus? Fortificai-vos contra todas as lutas interiores e exteriores pelo pensamento de que após esta vida entrareis na grande família do Pai celeste, a mais nobre, santa, amante e amável que jamais houve. Composta da caridade incriada, que é Deus, do amor encarnado, que é Jesus, da Rainha e Mãe de misericórdia e da elite da criação, os anjos e os eleitos, receber-vos-á em seu seio com ternura inefável e inalterável. Que santa embriaguez gozar do bem supremo, em união com uma assembleia tão augusta da qual se faz parte e da qual se partilham as glórias, as alegrias, as riquezas e a imortalidade bem-aventurada!

Lembre-se de que o Senhor recompensa o servo fiel e perseverante: “Por um pequeno castigo receberão grandes favores. Deus os colocou à prova e os achou dignos de si” (Sb 3, 5).

“Meu Deus, como é consoladora essa perspectiva, mormente nas penas, tentações, dificuldades e desgostos deste miserável exílio! Dignai-vos fortalecer em mim: 1.° A esperança e o desejo de possuir-vos um dia na Jerusalém celeste; 2.° A confiança de obter de Vós o que para lá me conduz, mormente o espírito de graça e oração, chave de todas as virtudes” (Pe. Luís Bronchain).

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 05 de fevereiro de 2009

 

 

Bibliografia

 

Bíblia Sagrada

A Vida Eterna, Mons. Tihamer Töth

Pe. Luís Bronchain, Meditações para todos os dias do ano

Pe. Alexandrino Monteiro, Raios de Luz

Santo Afonso Maria de Ligório, A Prática do amor a Jesus Cristo

São Cipriano, Do Tratado “Sobre a Peste”

Bem-aventurada Elisabete da Trindade, Obras Completas

Pe. Francisco Alves, Tesouro de Exemplos

Santa Teresa dos Andes, Diário

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Céu: oceano de felicidade"

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