MORTE DO PECADOR

 (Ez 7,  25)
 

"Sobrevirá a angústia. Eles buscarão a paz, mas nada!"
 

 
 

O que é o pecado mortal? "É uma transgressão da lei divina, pela qual se falta gravemente aos deveres para com Deus, para com o próximo, ou para conosco" (São Pio X, Catecismo Maior, 948).

De todos os males, o pecado mortal é o pior: "O maior mal do mundo, o mal que entre todos os males merece verdadeiramente o nome de mal - é o pecado. A sua fealdade não tem semelhante; a sua gravidade é, em certo modo, infinita; os seus castigos são eternos!" (Pe. Alexandrino Monteiro).

O pecado é um grande mal, e o pecador comete-o como se estivesse bebendo um copo d'água na hora da sede: "Aos pecadores conviria o hospício de loucos" (São João de Ávila), e: "Mas a maior desdita destes miseráveis consiste em que, não obstante sua cegueira e insensatez, julgam ser sábios e prudentes" (Santo Afonso Maria de Ligório).

Acorda pecador! Você não foi criado por Deus para ofendê-lO, e sim, para conhecê-lO, amá-lO e servi-lO: "Como é belo, como é grande conhecer, amar e servir a Deus!" (São João Maria Vianney).

Acorda pecador! É grande estupidez trocar a graça de Deus pelo lixo do mundo: "Ó meu Deus, por uma miserável satisfação perder o Bem supremo, perder a glória, perder também a paz nesta vida, deixando que o pecado reine na alma e a atormente com seus incessantes remorsos..." (Santo Afonso Maria de Ligório)

Acorda pecador! A sua vida vai passando como um sopro: "Meus dias correm mais depressa que um atleta..." (Jó  9, 25).

Acorda pecador! Você não está ofendendo o seu cachorrinho de estimação, e sim, o Deus Infinito: "O pecador não só ofende a Deus, mas também o desonra" (Santo Afonso Maria de Ligório).

Acorda pecador! Por que tanta rebeldia? Você se sente o senhor do mundo, mas na verdade não passa de uma lata de vermes imundos: "O homem é um saco de vermes, pasto de vermes, que cedo o hão de devorar. O homem é um miserável que nada pode, um cego que nada vê... verme miserável que se atreve a injuriar a Deus" (São Bernardo de Claraval).

Acorda pecador! Por que desprezar tanto o Senhor que te criou e cuida de você? "O pecador injuria, desonra a Deus e, no que toca sua parte, o cobre de amargura, pois não há amargura mais sensível do que ver-se pago com ingratidão pela pessoa amada em extremo favorecida. E a que se atreve o pecador?... Ofende ao Deus que o criou e tanto o amou, que deu por seu amor o sangue e a vida" (Santo Afonso Maria de Ligório).

Acorda pecador! Lembre-se de que você morrerá e comparecerá imediatamente diante do terrível Tribunal de Deus: "E como é o fato que os homens devem morrer uma só vez, depois do que vem um julgamento" (Hb 9, 27).

Pecador! Como será a sua morte? Você já parou para pensar? Já examinou a sua vida?

O Pe. Alexandrino Monteiro escreve: "Um dia virá em que se há de desmoronar a casa do teu corpo, não ficando pedra sobre pedra. Hão de fechar-se teus olhos, hão de gelar-se as tuas mãos, hão de, enfim, desatar-se os teus ossos dos liames da carne!...

Ou queiramos ou não, teremos de receber um dia a visita da morte!

Oh! Que dia esse, que angústias, quando ouvirmos os seus passos, quando a virmos abeirar-se do nosso leito, quando sentirmos a sua mão gelada pousar sobre a nossa fronte!

Oh! Que momento terrível! Oh! Que hora de consternação! - É o momento do desenlace fatal, é a hora mais solene da vida humana! Somos, então, chegados ao último capítulo dessas memórias, que todos temos de escrever no decurso da nossa viagem!...

Oh! Que momento o da morte! Momento de dúvidas e de agonias, de perplexidades e incertezas: - Se me salvarei... se me condenarei!... Ponto terrível, em que o tempo se junta com a eternidade, passo arriscado deste para o outro mundo, tão novo e desconhecido!

Transe difícil para o pobre enfermo! Se olha para o passado, vê a série de todos os atos nascidos de sua liberdade. Se olha para o futuro, vê duas eternidades: uma, prêmio das virtudes; outra, castigo dos vícios".

E você pecador, que se acha o centro das atenções; não se esqueça de que você também morrerá, será colocado num túmulo, devorado pelos vermes e reduzido a uma colher de cinza.

Pecador! Naquele momento de angústia você desejará não ter nascido ou tornar a nascer, para corrigir na segunda vida os erros da primeira. Mas já será tarde! Ou bem ou mal gasta, a vida vai terminar!

Os seus "amigos", aqueles que te incentivaram a pecar, fugirão de ti naquele momento. Somente a agonia, desespero e dúvidas estarão presentes.

Pecador miserável! Onde está a sua "turma"?

Pecador desprezível! Cadê os seus "amigos fiéis"?

Pecador estúpido! Mostre agora todo o seu assanhamento.

Viveste como louco, e agora terá que deixar esse mundo e comparecer diante do Deus que ofendeste tanto.

Como é triste a morte do pecador, que viveu de costas para Deus e que lutou para encontrar a paz no pecado: "Quando, porém, se virem em face da eternidade e nas agonias da morte, já não poderão escapar aos tormentos de sua má consciência, nem encontrar a paz que procuram. Pois, como pode encontrá-la uma alma carregada de culpas, que, como víboras a mordem? Que paz poderão gozar pensando que em breve deverão comparecer ante Cristo Jesus, cuja lei e amizade desprezaram até então?... O anúncio já recebido da morte próxima, a idéia  de se separar para sempre de todas as coisas do mundo, os remorsos da consciência, o tempo perdido, o tempo que falta, o rigor do juízo de Deus, a eternidade infeliz que espera o pecador, todas essas coisas produzirão perturbação terrível que acabrunha e confunde o espírito e aumenta a desconfiança. E neste estado de confusão e desespero, o moribundo passará à outra vida" (Santo Afonso Maria de Ligório).

Como é triste a morte do pecador, que se julgava o dono de tudo, e que agora está assustado e prostrado em um leito: "Ó Deus, que confusão e susto não serão os do pobre pecador que se descuidou de sua consciência, quando se vir oprimido pelo peso dos pecados, do temor do juízo, do inferno e da eternidade! Que confusão e angústia produzirão nele tais pensamentos, quando se achar desfalecido, a mente obscurecida, e entregue às dores de uma morte já próxima!" (Idem).

Como é triste a morte do pecador; ele serviu aos demônios durante a vida, e os terão próximo ao seu leito na hora da morte: "Não uma só, senão muitas serão as angústias que hão de afligir o pobre pecador moribundo. Ver-se-á atormentado pelos demônios, porque estes terríveis inimigos empregam nesse transe os seus esforços para perder a alma que está prestes a sair desta vida. Sabem que lhes resta pouco tempo para apoderar-se dela e que, escapando-se agora, jamais será sua... Não estará ali apenas um só, mais muitos demônios hão de rodear o  moribundo para o perder. Dirá um: 'Nada temas, que te restabelecerás'. Outro exclamará: 'Tu, que durante tantos anos foste surdo à voz de Deus, esperas agora que ele tenha misericórdia de ti?' 'Como - intervêm outro - poderás reparar os danos que fizeste, restituir as reputações que prejudicaste?' Outro, enfim, dirá: 'Não vês que todas as tuas confissões foram nulas, sem contrição, sem propósito? Como podes agora renová-las?" (Santo Afonso Maria de Ligório).

Como é triste a morte do pecador, estará rodeado de suas culpas na hora da morte: "Estes pecados, com outros tantos verdugos acercar-se-ão dele e lhe dirão: 'Somos a tua obra, e não te deixaremos. Acompanhar-te-emos à outra vida, e contigo nos apresentaremos ao eterno Juiz'. Quisera então o moribundo desembaraçar-se de tais inimigos, mas para consegui-lo seria preciso detestá-los e converter-se a Deus de todo o coração. O espírito, porém, está coberto de trevas e o coração endurecido" (São Bernardo de Claraval).    

Como é triste a morte do pecador; o seu coração não conseguirá se livrar do mal na hora da morte: "O coração, obstinado no mal durante a vida, se esforçará, no momento da morte, para sair do estado de condenação; mas não chegará a livrar-se dele, e, oprimido por sua própria malícia, terminará a sua vida no mesmo estado. Tendo amado o pecado, amava também o perigo da condenação. É por isso justamente que o Senhor permitirá que ele pereça nesse perigo, no qual quis viver até à morte" (São Bernardo de Claraval), e: "Aquele que não abandona o pecado antes que o pecado abandone a ele, dificilmente poderá na hora da morte detestá-lo como é devido, pois tudo o que fizer nessa emergência, o fará obrigadamente" (Santo Agostinho).     

Como morreu o grande Voltaire.

A propósito da morte do famigerado mestre da impiedade do século XVIII, descreve Armel Kerven em seu livro "Voltaire", o seguinte:      

Entrando em casa alta noite, enervado pela emoção, saturado de lisonjas, teve Voltaire um violento acesso de febre.

O marquês de Villete, em cuja casa se hospedara, mandou logo chamar um padre. Lá estava, porém, uma legião de enciclopedistas. Voltaire não quis dar o braço a torcer diante deles... O padre, despedido, retirou-se dizendo que estaria à disposição do doente. Era o padre Gaultier, coadjutor de São Sulpício.

Dois dias depois, teve o filósofo um fluxo de sangue que o debilitou em extremo. Julgou-se perdido, pediu uma pena e traçou com mão trêmula este bilhete ao senhor Padre Gualtier:

 "Prometeu-me vir ouvir-me. Peço-lhe o obséquio de vir quanto antes. 26 de fevereiro de 1778. - Voltaire".

Ocupado com outro doente, o padre chegou à casa alta noite. Só no dia seguinte, ao romper do dia, recebeu o bilhete, e mais um outro.

 "Mme. Denis, sobrinha do M. Voltaire, pede ao padre Gaultier vir vê-lo. Ficará obrigada. 27 de fevereiro de 1778. Em casa do senhor marquês de Villette".

O padre foi aconselhar-se com o seu Superior, que lhe ordenou exigisse antes de tudo uma retratação. Foi necessário lutar dois dias com os filósofos que não queriam tal coisa. Enfim venceu o padre. Eis o teor exato da retratação:

 "Declaro que, sofrendo há dias de vômitos de sangue, na idade de 84 anos, e não tendo podido arrastar-me até a igreja, o senhor vigário de São Sulpício fez-me o obséquio de mandar-me o padre Gaultier; que me confessei a ele e que, com o favor de Deus, morrerei na religião católica em que nasci, esperando da misericórdia divina que ela me perdoe todas as minhas faltas. Se escandalizei a Igreja, peço perdão a Deus e a ela. - A 2 de março de 1778, em casa do senhor marquês de Villette, em presença do senhor padre Mignot, meu sobrinho, e do senhor marquês de Villevieille, meu velho amigo. Voltaire".

As duas testemunhas assinaram.

Depositado no cartório do "Mestre Monet", tabelião em Paris, esse documento foi publicado.

Apenas recebeu Voltaire os sacramentos, melhorou. Os enciclopedistas, seus amigos, que se tinham afastado, voltaram ao aposento do doente, e não o deixaram mais. - E Voltaire começou logo a meter à bulha aquilo que chamava uma "fantasia de penitência", esquecendo seus terrores, à medida que convalescia, e zombando da misericórdia divina, a qual enfim o abandonou.

No mês de maio, caindo de cama com um novo acesso, foi chamado a toda a pressa o Doutor Tronchin, seu médico assistente, que não lhe ocultou a gravidade do caso.

Quis Voltaire chamar de novo o padre; mas a Enciclopédia tinha jurado que venceria. D' Alembert, Marmontel e Diderot montaram guarda ao doente, ficaram surdos ao seu pedido e só permitiram  que dois padres, vindo de São Sulpício, pudessem aproximar-se do doente, quando o delírio do moribundo lhes impossibilitava o ministério.

Morreu Voltaire em pavoroso desespero. Da vizinhança, todos ouviam seus gritos de raiva.

- "Retirem-se! Retirem-se! Urrava ele, apostrofando os enciclopedistas. Foram vocês que me perderam! Eu não carecia dos senhores. Vocês é que não podiam passar sem mim. E que miserável glória me arranjara!"

- No meio dos temores e angústias, ouvia-se simultaneamente ou sucessivamente, invocar a Deus e blasfemar... Ora em voz lamentável, ora com o tom do remorso, e mais amiúde em acessos de furor exclamava;

- Jesus Cristo! Jesus Cristo!

Richelieu, testemunha desse espetáculo, fugiu dizendo: É demais! Não se pode aguentar!

O horrível drama continuou. O moribundo se contorcia no leito e rasgava o peito com as unhas. Chamava pelo padre Gaultier, mas os adeptos, reunidos na antecâmara, tampavam os ouvidos e não quiseram que esse sacerdote, recebendo os últimos suspiros do seu patriarca, estragasse a obra da filosofia.

Ao chegar o momento fatal, nova crise de desespero:

- Sinto que me arrastam ao tribunal de Deus! E, voltando para a parede, o olhar apavorado:

- Ali está o demônio; quer me agarrar... Eu vejo-o. Vejo o Inferno... Escondam-me...

Finalmente, condenou-se a si mesmo, ao realizar aquele festim, a que sua ignorância e sua paixão anti-bíblica tantas vezes fizera sentar-se o profeta Ezequiel; e, dessa vez sem zombaria, num acesso de sede ardente... levou aos lábios o penico e tragou o conteúdo! Deu um último urro e expirou sufocado pelas fezes e pelo sangue que lhe jorravam pela boca e pelo nariz.

Os filósofos proibiram expressamente a toda gente da casa que contassem isso, mas não puderam impor silêncio ao médico assistente.

Pecador, não se esqueça; chegará também a sua hora! Você pode fugir para os desertos, para o alto das montanhas, se esconder nas cavernas, etc., mas da morte não escapará.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 08 de julho de 2007

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Morte do pecador"

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