AVE, CHEIA DE GRAÇA

(Lc 1, 28)

 

“Entrando onde ela estava, disse-lhe: ‘Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo!”

 

 

Uma jovem, embora tivesse aprendido a amar a Virgem Santíssima, sentia-se, contudo, muito inclinada a bailes e passeios. Sua mãe, condescendente, proporcionava-lhe para isso os vestidos mais ricos e vistosos.

Um domingo, muito cansada de dançar, sentou-se a jovem debaixo de uma árvore do jardim para descansar. Ali, apareceu-lhe o diabo e disse-lhe:

- Levanta-te e vem comigo!

- Quem és?

- Sou o diabo, a quem com tuas desonestidades serves tão bem, dando-me muitas almas. Agora é a tua vez; vem comigo!

Quando o diabo quis agarrá-la, ela gritou por socorro, invocando a Nossa Senhora e rezou uma Ave-Maria.

- Sem essa oração – disse-lhe o demônio – por justo juízo de Deus estarias morta e eu te levaria para o inferno.

Aquela jovem nunca mais quis saber de bailes e tornou-se dali em diante fervorosa filha de Maria, a Virgem Imaculada.

 

1.° Excelência da Ave-Maria

 

Jesus revelou-nos a fórmula de oração que devemos dirigir diariamente ao Pai celeste; assim o Espírito Santo, pelo arcanjo São Gabriel, Santa Isabel e a Igreja Católica, compôs a petição que devemos fazer à nossa Mãe celeste.

A Ave-Maria ou a saudação angélica, é a mais bela oração depois da oração dominical. Por ela veneramos, saudamos e exaltamos a Mãe das nossas almas nos termos de que se serviu o próprio Deus, por seu embaixador fiel, para o grande mistério da Anunciação; felicitamo-la com o anjo e Santa Isabel, pela sublime prerrogativa que a distingue de todas as criaturas, tornando-a Mãe do Criador. Depois com a Igreja, inspirada pelo Espírito Santo, suplicamos-lhe, por sua divina maternidade, venha em nosso auxílio na vida e na morte.

Não é, pois, sem motivo que os santos tanto estimaram a recitação dessa tocante súplica. Santo Afonso Rodrigues recitava-a devotamente sempre que ouvia bater as horas; à noite, os anjos o despertava para que se desempenhasse desse atributo de louvores para com sua Rainha bem-amada. E qual não era a estima em que Santo Afonso tinha à saudação angélica! Recitava-a de quinze em quinze minutos e afirmava ser ela mais preciosa diante de Deus do que toda a criação. Essa oração foi, de fato, como o anúncio e o começo do mundo regenerado, mundo de graça, infinitamente superior a toda a natureza. Proporciona-nos, ademais, bens tão desejáveis que uma religiosa beneditina, aparecendo depois da morte, declarou estar pronta a padecer até ao dia do juízo universal as dores de sua última enfermidade, para obter um grau de glória correspondente ao mérito duma Ave-Maria.

Santo Alberto Magno escreve: “A saudação angélica foi ditada por Deus Pai, escrita por Deus Filho, confirmada por Deus Espírito Santo e anunciada pelo arcanjo São Gabriel”. As palavras que lhe acrescentaram Santa Isabel e a Igreja, esposa de Jesus Cristo, são igualmente inspiradas pelo Espírito Divino. Do céu, e não da terra, é que nos vem essa oração. — Também a Rainha do céu conservou-lhe a maior estima. “Se me fora dado saudar-vos, disse-lhe um dia Santa Matilde, com a mais doce saudação jamais saída do coração humano, com júbilo e alegria o faria”. Ao que a Rainha dos anjos lhe apareceu tendo sobre o peito a saudação angélica escrita em caracteres de ouro. “Jamais, respondeu-lhe Maria, homem algum excederá essa saudação. Por ela Deus Pai foi o primeiro a saudar-me, isentando-me do pecado de Eva em virtude da sua onipotência. Por ela Deus Filho iluminou-me com sua sabedoria infinita, para me tornar o astro brilhante que ilumina o céu e a terra segundo a significação de meu nome de Maria. Por ela o Espírito Santo, penetrando-me da plenitude da sua divina doçura, cumulou-me de sua graça de tal forma que quem a procurar por meu intermédio a conseguirá infalivelmente”. Assim falou a divina Mãe. — Nenhuma oração, pois, a ela dirigida, se compara à saudação angélica.

Temo-la recitado com o mais profundo respeito, imitando a São Gabriel, que abordou Maria cheia de humildade e lhe falou com extrema veneração? Não esqueçamos jamais que ela é nossa soberana e que as suas grandezas ultrapassam a todo encômio. — Mas, como ela é também nossa Mãe, unamos ao respeito à devoção e a confiança. Digamos-lhe, pois, com a piedade e amor de Santa Isabel: “Bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre”. Acrescentemos com a Igreja Católica: “Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Rogai por nós agora que estamos no mundo como num mar agitado e fecundo em naufrágios: obtende-nos a vitória sobre as tentações, a vigilância para evitarmos os escolhos e o espírito de oração para pedirmos constantemente o vosso socorro. — Rogai por nós em nossa última hora, em que os combates são mais rudes, os sofrimentos mais deprimentes e os perigos mais temíveis”. Agora e na hora da nossa morte.

A Ave-Maria é uma oração que nunca cansa. Quando se fala das coisas da terra, do comércio e da política, a gente se cansa: mas quando se fala de Nossa Senhora é sempre novo...

Todos os santos têm uma grande devoção por Nossa Senhora; nenhuma graça vem do céu sem passar por suas mãos. Quando se quer oferecer alguma coisa a um grande personagem, faz que esse presente seja oferecido pela pessoa que ele mais prefere, a fim de que goste da homenagem.

Assim, pois, as nossas orações, apresentadas pela Virgem Santa, têm sem dúvida algum mérito, porque a Virgem Santa é a única criatura que jamais ofendeu a Deus. Somente Nossa Senhora cumpriu o primeiro mandamento: um só Deus adorarás e amarás perfeitamente. Ela o cumpriu em sua totalidade... Tudo o que o Filho pede ao Pai lhe é concedido. Tudo o que a Mãe pede ao Filho lhe é igualmente concedido.

Quando nossas mãos tocarem aromas, perfumam tudo o que tocam; façamos passar nossas preces pelas mãos de Nossa Senhora: ela as perfumará.

A Ave-Maria é a mais bela de todas as orações depois do Pai-Nosso. É a saudação mais perfeita que podeis fazer a Maria, pois é a saudação que o Altíssimo indicou a um arcanjo para ganhar o coração da Virgem de Nazaré. E tão poderosas foram aquelas palavras, pelo encanto secreto que contêm, que Maria deu seu pleno consentimento para a Encarnação do Verbo, embora relutasse em sua profunda humildade.

A Ave-Maria, rezada com devoção, atenção e modéstia, é, como dizem os santos:  inimigo do demônio,  martelo que o esmaga, santificação da alma, alegria dos anjos, melodia dos predestinados, cântico do Novo Testamento, prazer de Maria e a glória da Santíssima Trindade.

A Ave-Maria é um orvalho celeste que torna a alma fecunda; é um beijo casto e amoroso que se dá em Maria, é uma rosa vermelha que se lhe apresenta, é uma pérola preciosa que se lhe oferece, é uma taça de ambrosia e de néctar divino que se lhe dá.

Maria Santíssima nos saúda de bom grado com alguma graça, se nós, de bom grado, a saudamos com a Ave-Maria. Quem saúda Nossa Senhora é saudado por ela.

Toda vez que rezamos a Ave-Maria, deveríamos fazê-lo com tal entusiasmo, que o coração nos fugisse do peito! Quando parece que Nossa Senhora não nos olha, sacudamo-la com uma Ave-Maria!

Com que fervor, pois, devemos recitar a Ave-Maria, mormente ao toque do relógio, ou no começo de qualquer trabalho, ao sairmos de casa, ao recebermos alguém e ao darmos um conselho! Façamo-lo pelo menos: 1.° Antes das refeições, do descanso e das recreações; 2.° Nos combates que nos dão o mundo, a carne e o demônio; 3.° Nas dores e provações da vida e em todas as ocasiões difíceis de exercer a virtude.

Ó minha soberana e minha Mãe Maria! Quisera saudar-vos e suplicar-vos a cada instante do dia e da noite. Felizes são os corações perfumados com o bálsamo da Ave-Maria! Difundem ao redor de si o bom odor de Jesus, do qual sois a mais perfeita imagem. Obtende-me a graça de espargir sobre a minha vida as rosas preciosas da saudação angélica, a fim de que depois da minha morte eu chegue a vós trescalando o seu doce perfume.

 

2.° Doutrina e ensinamento da Ave-Maria

 

Nessa oração começamos dando parabéns à Mãe do Verbo encarnado por causa das suas grandezas. “Ave, isto é, eu vos saúdo, Maria, cheia de graça”. Essa saudação, diz Santo Tomás de Aquino, impõe-se à nossa admiração por sua novidade; jamais anjo algum havia pronunciado semelhante saudação. — Mas por que chama o anjo a Maria: “Cheia de graça?”, é porque a Virgem, diz o doutor angélico, recebeu dela plenitude assaz grande para santificar todos os homens! Isso deve fortalecer a nossa confiança quando a suplicamos. Essa confiança aumenta-se quando pronunciamos devotamente o nome de Maria, que é um nome de doçura, esperança e amor, nome que ilumina, fortifica e consola todos os que a invocam.

“O Senhor é convosco”; isto é, de maneira mais especial do que com as outras criaturas. E, realmente, o Pai celeste está com Maria, como com sua filha por excelência, o Filho como com sua digna Mãe, o Espírito Santo como com sua esposa bem-amada.

Ave, cheia de graça, o Senhor é convosco (Lc 1, 28). Que pode haver de mais sublime que esta alegria, ó Virgem Mãe? Que pode haver de mais excelente que esta graça com a qual somente vós fostes por Deus cumulada? Que de mais jubiloso e esplêndido se pode imaginar? Tudo está longe do milagre que em vós se contempla, muito aquém de vossa graça. As maiores perfeições, comparadas convosco, ocupam um plano secundário, possuem um brilho bem inferior.

O Senhor é contigo. Quem ousará competir convosco? Deus nasceu de vós. Haverá alguém que não se reconheça inferior a vós, e, ainda mais, não vos conceda alegremente a primazia e a superioridade? Por isso, contemplando vossas eminentes prerrogativas, que superam as de todas as  criaturas, aclamo-vos com o maior entusiasmo: Ave, cheia de graça, o Senhor é convosco. És, pois, a fonte da alegria dos homens, até dos anjos!

“Bendita sois vós entre as mulheres”; ó Maria, bem diferente de Eva, que caiu na maldição do pecado e nos arrastou consigo em sua ruína. Hoje somos benditos convosco, ó Mãe de Deus e Mãe das nossas almas. E donde nos vem essa bênção? De Jesus, bendito antes de todos os séculos, e de vós, ó Maria, que sois poderosa junto d’Ele. E bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.

Na verdade, bendita sois vós entre as mulheres (Lc 1, 42), pois transformastes em bênção a maldição de Eva, fazendo com que Adão, abatido pela maldição, fosse por vós erguido e abençoado.

Na verdade, bendita sois vós entre as mulheres, porque a bênção do pai iluminou os homens por meio de vós, livrando-os da antiga maldição.

Na verdade, bendita sois vós entre as mulheres, porque até os teus antepassados encontraram em vós a salvação, pois destes à luz o Salvador que obteve para eles a salvação eterna.

Na verdade, bendita sois vós entre as mulheres, pois, sem contribuição do homem, produzistes o fruto que trouxe a bênção para toda a terra, redimindo-a da maldição que só produzia espinhos.

Na verdade, bendita sois vós entre as mulheres, porque, embora simples mulher, vos tornastes verdadeiramente Mãe de Deus. Se aquele que nasceu de vós é realmente Deus feito homem, sereis com razão chamada Mãe de Deus, dando verdadeiramente à luz aquele que é Deus.

Depois de saudarmos e louvarmos assim a Santíssima Virgem, lançamos um olhar para nós e, penetrados do sentimento das nossas misérias, dizemos-lhe: “Santa Maria, Mãe de Deus”. Os filhos gostam de repetir o nome de sua Mãe e de proclamar-lhe os títulos de nobreza; reanimam assim o seu amor e confiança.

Quanto maior nos parece a nossa miséria, tanto mais Maria se ostenta pura e elevada. Eis por que acrescentamos: “Rogai por nós, pecadores”, rogai agora que lutamos contra nós mesmos, contra os nossos vícios e paixões, contra as tentações do mundo e do inferno. Rogai por nós, sobretudo, “na hora da nossa morte”, quando a fraqueza, a que nos reduzir a enfermidade, exigirá da vossa parte, ó Maria, um socorro mais apressado, poderoso e maternal. Rogai por nós quando recebermos os últimos sacramentos, e nossa alma, lutando na agonia, estiver para comparecer diante de Deus. Recebei-a, ó Mãe da nossa salvação. Assim vos ficaremos devendo a vida da glória, como vos devemos a vida da graça. Rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte.

 

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP.

Anápolis, 15 de janeiro de 2009

 

 

Bibliografia

                   

Bíblia Sagrada

Pe. Francisco Alves, Tesouro de Exemplos

São Sofrônio, Sermões

Pe. Luis Bronchain, Meditações para todos os dias do ano

São João Maria Vianney, Escritos

São Luís Maria Grignion de Montfort, Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem

Bem-aventurado José Allamano, A Vida Espiritual

Santo Afonso Maria de Ligório, Glórias de Maria

 

 

 

Veja também:

Grandezas de Maria Santíssima

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Ave, cheia de graça"

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