ÉS MALDITA

(Gn 3, 14-15)

 

“Então Deus disse à serpente: ‘Porque fizeste isso és maldita entre todos os animais domésticos e todas as feras selvagens. Caminharás sobre teu ventre e comerás poeira todos os dias de tua vida. Porei hostilidade entre ti e a mulher, entre tua linhagem e a linhagem dela. Ela te esmagará a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”.

 

A maldição caiu sobre a serpente que os seduziu: “Porque fizeste isso és maldita entre todos os animais domésticos e todas as feras selvagens”.

O fogo eterno não foi preparado propriamente para o homem, e sim, para aquele que seduziu e fez o homem pecar: “Ide malditos, ao fogo eterno, preparado para o diabo e os seus anjos” (Mt 25, 41).

“Caminharás sobre teu ventre”. A vida abjeta (desprezível) que leva a serpente arrastando-se sobre o abdômen, de bruços pela terra, é símbolo da humilhação (isso significa morder a terra) infligida por castigo ao demônio, que por meio dela seduzira a mulher.

“... comerás poeira todos os dias de tua vida”. Sabemos que a serpente não se alimenta da poeira, porém na antiguidade parece que acreditavam, porque ela sempre aparece revolvendo na poeira: “Quanto à serpente, o pó será o seu alimento” (Is 65, 25), e: “Que lambem o pó como a serpente...” (Mq 7, 17). Porém, nisto vê também o autor sagrado um sinal de humilhação: “comerás poeira” equivale a ser vencido: “Diante dele a Fera se curvará e seus inimigos lamberão o pó” (Sl 72, 9).

“Porei hostilidade entre ti e a mulher, entre tua linhagem e a linhagem dela. Ela te esmagará a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar”. A serpente continua a ser símbolo do Demônio. A descendência da mulher vencerá o Demônio da maneira que o homem esmaga a cabeça de uma serpente. A descendência da mulher é, em geral, o gênero humano, mas principalmente o Salvador, Jesus Cristo, o chefe de toda a humanidade (Cl 1, 15-18). Ele venceu o Demônio por virtude própria, os outros o vencem por virtude dele. Este versículo contém, portanto, a primeira promessa do futuro Redentor, e é por isso chamado o proto-evangelho. Ao triunfo do Salvador associa-se sua Mãe, a grande Mulher, que é o oposto de Eva (Lc 1, 26-38); aqui já transluz a celeste figura da Imaculada.

Esta inimizade não é só entre a mulher e a serpente, mas será uma inimizade perpétua, e se estenderá à descendência de uma e outra, até que a descendência da mulher esmague definitivamente a sua cabeça, tendo que contentar a serpente em “ferir” o calcanhar da mulher.

O Demônio acreditava que com a primeira sedução teria colocado sob seus pés a primeira mulher e a sua descendência, estabelecendo uma amizade perpétua. Por desígnios providenciais divinos, o resultado será totalmente o contrário, já que desde este momento se estabelece uma guerra entre a serpente e Eva, entre a descendência daquela e a desta, luta que culminará com a vitória total da descendência da mulher, da própria humanidade, que agora tem sido vencido em Eva. Esta será a maldição e castigo da serpente, que agora aparece como vencedora. Sua vitória é na realidade o princípio de uma derrota maior e definitiva.

O Concílio Vaticano II ensina: “Deus, criando e conservando todas as coisas pelo Verbo (cfr. Jo 1,3), oferece aos homens um testemunho perene de Si mesmo na criação (cfr. Rm 1, 19-20) e, além disso, decidindo abrir o caminho da salvação sobrenatural, manifestou-se a Si mesmo, desde o princípio, aos nossos primeiros pais. Depois da sua queda, com a promessa de redenção, deu-lhes a esperança da salvação (cfr. Gn 3,15), e cuidou continuamente do gênero humano, para dar a vida eterna a todos aqueles que, perseverando na prática das boas obras, procuram a salvação (cfr. Rm 2, 6-7)”.

A Igreja Católica sempre entendeu estes versículos no sentido messiânico, referidos a Jesus Cristo; e tem visto na mulher, mãe do Salvador prometido, a Virgem Maria como nova Eva: “Da mesma forma, o nó da desobediência de Eva foi desatado pela obediência de Maria, e o que Eva tinha amarrado pela sua incredulidade, Maria soltou pela sua fé” (Santo Irineu). E, comparando a Virgem Maria com Eva, chamam-na: “Mãe dos viventes” (Santo Epifânio). Afirma com maior frequência: “A morte veio por Eva, por Maria a vida” (São Jerônimo).

Essa mulher é a Santíssima Virgem, nova Eva e mãe do Redentor, que participa de forma antecipada e preeminente na vitória de seu Filho. Ela nunca pecou e a Igreja a proclama como a Imaculada Conceição.

Se Deus não impediu que o primeiro homem pecasse foi, segundo explica Santo Tomás de Aquino, porque: “Deus, com efeito, permite que os males aconteça para tirar deles um maior bem”.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 06 de abril de 2013

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Bíblia Sagrada, Pontifício Instituto Bíblico de Roma

Santo Irineu, Adversus haereses

Pe. Alberto Colunga, Bíblia comentada

Concílio Vaticano II, Dei Verbum, 3

Santo Epifânio, Adversus haereses Panarium

São Jerônimo, Epístola

Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica

 

 

 

 

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Pe. Divino Antônio Lopes FP. “És maldita”

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