AI DE VÓS QUE AGORA RIDES!

(Lc 6, 25)

 

“Ai de vós que agora rides, porque vestireis luto e chorareis!”

 

Há quem enlouqueça pelas honras; outros, pelos prazeres; não poucos, pelas futilidades da terra. E se atrevem a considerar loucos os santos, que desprezam os bens mesquinhos do mundo para conquistar a salvação eterna e o Sumo Bem, que é Deus

Com justiça Jesus Cristo repreende os que agora riem de maneira excessiva, entregando-se a conversações inúteis, a cantos, danças, badernas e impurezas, e procuram passar a vida em loucas alegrias. É suficiente considerar onde riem, quando riem e de que riem.

Se observares ONDE RIEM, verás que o fazem “no vale dos prantos” (Sl 83, 7), onde outra coisa não existe senão desventuras e maldades, que nos convidam a chorar, senão por outro motivo, pelo menos por compaixão do nosso próximo que sofre. Por isso é que esta nossa terra se denomina: “Lugar dos que choram” (Jz 2, 5).

Se observares QUANDO RIEM, verás que o fazem fora de tempo, porque Deus, para o riso, reservou a vida futura, não a presente: “Há tempo de chorar e tempo de rir” (Ecl 3, 4). O pranto deve preceder, o riso virá depois. Aqueles pervertem essa ordem maravilhosa: querem transformar o dia em noite.

Se, por fim, observares de que COISA ELES SE RIEM, verás que riem precisamente do que deveriam chorar, e muito: “Alegrem-se do mal que fazem, e rejubilam com as coisas mais perversas” (Pr 2, 14). Quanto mais cresce o mal, tanto mais deve aumentar a tristeza. E eles fazem exatamente o contrário: gozam com as coisas más e exultam com as péssimas. Pois bem, vejas tu que riso de iniquidade é esse, em tempo de miséria, onde reina a melancolia, em ações de pura malvadez. E tu pouco falta para os invejares?

Pobres pecadores! Afadigam-se com empenho para adquirir a ciência humana e procurar os bens da vida presente que tão cedo se acaba, e desprezam os bens dessa outra vida que jamais terá fim! De tal modo perdem o juízo que não somente se tornam insensatos, mas se reduzem à condição dos brutos; porque, vivendo como irracionais, sem considerar o que é o bem e o mal, seguem unicamente o instinto das afeições sensuais, entregam-se ao que lisonjeia a carne, sem pensar no que perdem, nem na ruína eterna que os ameaça. Isto não é portar-se como homem, senão como besta.

Examina o castigo de antemão reservado por Jesus Cristo para esses miseráveis:“Ai de vós que agora rides, porque vestireis luto e chorareis!” O luto pertence à alma, o pranto ao corpo. Alma e corpo juntamente sobrecarregados com os sofrimentos terríveis do inferno: a pena do dano e a pena do sentido.

Que imensa loucura é, portanto, perder a graça de Deus em troca de um pouco de fumaça, de um breve deleite! Que não faz um empregado para obter as boas graças do seu patrão? E, no entanto, ó meu Deus, por uma miserável satisfação perder o Bem supremo, perder a glória, perder também a paz nesta vida, deixando que o pecado reine na alma e a atormente com seus incessantes remorsos… Perder tudo, e condenar-se voluntariamente à desgraça interminável!

Antes de tudo, considera o luto que espera pela alma com a pena do dano. Luto que na admite comparações! Não o pode avaliar quem não chega a compreender o que é Deus. Muitíssimos, neste mundo, mostram-se inconsoláveis por haverem perdido uma herança ou cargo elevado. Que será, então, daqueles que um dia hão de compreender haverem perdido para sempre um bem de valor infinito? Isso levará a imaginação a sentir-se eternamente aflitíssima com o pensamento da alegria imensa que no céu se goza, alegria imensamente maior do que o próprio mal tremendo que no inferno se padece (Pe. Paulo Ségneri). As paixões se desencadearão todas a um tempo e incessantemente: angústia, tédio, terror, desespero e ódio. A memória se atormentará com a lembrança vivíssima do tempo em que teria podido, com extrema facilidade, conquistar um bem sem limites, e não se preocupou. A inteligência estará nas trevas, agitada e turva, e com pertinácia se firmará na opinião de que Deus é injusto. A vontade obstinadamente consentirá nessa ideia, e assim aprovando todos os pecados cometidos, desejará, por despeito, tê-los cometido em maior número e gravidade; terá ódio contra Deus e a quem O ama, a quem O adora, e até a quem O nomeia, ainda que para amaldiçoá-lo. Pois bem: imagina o que seja um coração revestido de semelhante luto!

Medita ainda o pranto reservado ao corpo, com a pena dos sentidos. Que lágrimas não arrancam dos olhos de um enfermo a dor atrocíssima que o faz contorcer-se sobre seu leito de dores! No entanto, haverá ao menos um que sinta em si a dor que sente cada um dos condenados? Será um fogo real e efetivo: “No ventre do ímpio arderá o fogo” (Eclo 40, 32).

E se do interno do corpo queres passar ao externo, contempla todos os males, até os mais contrários entre si, encontrarem-se acumulados para punirem um só réu: dores desesperadoras de cabeça, de olhos, de todos os sentidos, e acrescentem-se a isso os tormentos que, sem cessar, procedem dos Demônios. Que rios amargos de pranto deverão verter aqueles condenados, ao se sentirem opressos sob o peso de todos esses tormentos que não podemos nem sequer imaginar: nossos vocábulos não conseguem exprimi-los plenamente. Então, sim, descontarão plenamente o riso antigo, um riso que foi breve e passageiro, por ter florido antes do tempo estabelecido. E o pranto será eterno!

Os condenados sofrem no Inferno uma dupla pena: a pena de dano, isto é, a privação do conhecimento direto de Deus, a separação definitiva d’Ele Apartai-vos de mim, obreiros da iniquidade (Mt 25, 41), Não vos conheço (Mt 25, 12) —, e a pena de sentido, figurada em expressões como “fornalha ardente”, “sede devoradora”... Que podem ser tomadas como metáforas. O fogo do Inferno é real, mas não se assemelha ao fogo que conhecemos, incapaz de exercer qualquer ação sobre um espírito, sobre a alma. Significa, pois, um queimor interior muito grande, semelhante ao sofrimento que experimentamos pelo remorso ou pelo desespero. Para falar da dor que a alma sofre no Inferno, temos de empregar imagens terrenas, tal como fazemos para descrever de algum modo a felicidade do Céu.

Há, portanto, a pena da privação de Deus e a pena causada pelo desespero que a alma experimenta por se ter afastado d’Ele e ter praticado o mal; tal como no caso dos Demônios, pelo fato do condenado já não poder amar a Deus, o seu amor transforma-se em ódio contra Deus, contra si mesmo e contra todos.

 

Pe. Divino Antônio Lopes FP (C)

Anápolis, 30 de janeiro de 2015

 

 

Bibliografia

 

Sagrada Escritura

Santo Afonso Maria de Ligório, Preparação para a morte

Monge Edouard Clerc, Que há para além da morte?

Pe. Paulo Ségneri, Temas Bíblicos

São Francisco de Sales, Filotéia

 

 

 

 

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