Instituto Missionário dos Filhos e Filhas da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo e das Dores de Maria Santíssima

 

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Deus manda fazer imagens

 

 

Os PROTESTANTES mentindo, perseguindo e seduzindo os católicos, dizem: “Deus proíbe fazer imagens”.

Resposta aos PROTESTANTES:

 

UTILIDADE DAS IMAGENS

 

Notaremos, logo de início, que o culto das imagens não é obrigatório neste sentido de que alguém, para salvar-se, tenha que possuir imagens ou prestar-lhes culto, nem também no sentido de que sem elas nós não pudéssemos nos dirigir aos seus protótipos. A Igreja poderia até proibir o uso das imagens em alguma região onde este culto estivesse sendo mal interpretado e não houvesse possibilidade de ser bem compreendido.

O que é obrigatório é reconhecerem os católicos a legitimidade do culto das sagradas imagens e que elas são dignas de todo o nosso respeito e veneração.

A Igreja mantém o culto das imagens porque resulta grande utilidade deste culto, que é legítimo, pois “a honra que se lhes tributa se refere aos protótipos por elas representados, de modo que, por meio das imagens que beijamos e diante das quais descobrimos a cabeça e nos curvamos, nós adoramos a Cristo e veneramos os santos, dos quais elas nos apresentam uma semelhança” (Concílio de Trento: sessão XXV). Não se entende absolutamente “que nelas haja alguma divindade ou alguma virtude, pela qual devam ser cultuadas, nem que é a elas que se deva pedir alguma coisa, nem que se deva pôr a confiança nas imagens, como acontecia outrora com os gentios que colocavam a esperança em ídolos” (Concílio de Trento: sessão XXV). O poder está em Deus que nos concede muitas graças pela intercessão dos santos, graças estas que são todas pedidas em nome de Jesus Cristo e alcançadas em virtude dos méritos de sua Paixão Redentora.

 

Qual é então a grande utilidade das imagens?

 

Fala-se muito hoje em ensino intuitivo, ou seja, fazer a pessoa ver em lugar de obrigá-la só a pensar e raciocinar. Os elementos mais eficazes para o ensino intuitivo são: o desenho, a gravura e a representação do objeto. Pois, este ensino intuitivo, a Igreja o vem empregando desde os primeiros séculos.

 

A imagem é o livro do analfabeto

 

O Protestantismo pode dispensar a imagem, porque é uma “religião inventada só para grandes sábios, para homens de grande cultura”. Cada protestante pretende ser, pelas suas próprias luzes, um intérprete da Bíblia; para isto se requer conhecimento do grego e do hebraico, bem como uma inteligência muito acima do comum, porque há textos na Bíblia que qualquer criança entende, mas há outros intrincadíssimos que desafiam os maiores gênios; interpretar um ou outro texto aqui e acolá pode ser fácil e contradição não há na Bíblia, porque ela é infalível; mas entender perfeitamente todos os textos e harmonizá-los, tendo em mãos edições sem comentários que tanto estão difundidas no seio da reforma, isto é uma tarefa dificílima.

Todos os protestantes são, portanto, ou pelo menos, deveriam ser grandes cabeças pensantes.

Mas a Igreja Católica, como o seu próprio nome indica, é uma Religião para todos, pois Católica quer dizer Universal; não só para os sábios, mas também para os rudes e os ignorantes. E um homem rude pode ouvir um sermão maravilhoso sobre a Paixão de Jesus Cristo e não ficar tão comovido como ao ver a Imagem de Cristo Crucificado, em que se pintam ao vivo os sofrimentos que Cristo aceitou por nosso amor. Sua cabeça pode ser fraca para guardar todas as ideias belíssimas do pregador, mas o seu coração é grande e bastante sensível para se impressionar com a obra de arte que vê, que tem diante de seus olhos.

O Padre Henrique van der Horst era vigário de Porto Calvo, em Alagoas, quando um dia, ao entrar na sua matriz, encontrou uma camponesa debulhada em lágrimas diante da imagem do Bom Jesus. Perguntando-lhe a razão de tantas lágrimas, a matutinha exclamou: “Não está vendo o senhor o que fizeram com Ele? Quanta malvadeza! Como é que O fizeram ficar assim nesse estado?”

O vigário procurou aproveitar a ocasião para fazer-lhe uma exortação: “Fomos nós que fizemos isto com os nossos pecados. Foi a senhora também, fui eu, foram todos os pecadores, porque Ele ficou assim para salvar a nossa alma”.

Mas o sermão não foi bem entendido: “Eu não! Eu não fiz nada com Ele! Foram os malvados que fizeram isto!”

A sua inteligência não pode perceber todo o alcance das palavras do sacerdote; mas o seu coração sabia expandir-se diante da imagem, na meditação dos sofrimentos de Jesus.

Também num lugarejo do interior de Pernambuco, três matutos (era um dia de feira) deixarem à porta da igreja matriz os seus sacos, cheios de mantimentos, porque regressavam para casa, e começaram a percorrer o templo sagrado. Logo lhes chamaram a atenção os quadros da Via-Sacra, em que estão gravadas as cenas passadas com Jesus no caminho do Calvário.

Um dos visitantes, mais desembaraçado, ia procurando interpretar para os outros as cenas que iam vendo. E entremeava as suas explicações com exclamações como esta: “Está vendo? Ele era Deus e sofreu tanto! E nós? Nós não queremos sofrer nada!”

Percebia-se claramente ali quanto a pintura é intuitiva para o analfabeto. Na sua muda linguagem estava a Via-Sacra fazendo o mais eloquente dos sermões.

Já São Gregório Nazianzeno (do século IV) falava de uma mulher pecadora que se converteu ao contemplar a imagem do mártir São Polemon (Carmen de vita sua L I.° secção II.ª v. 800 segs.) e São Gregório de Nissa (também do século IV) declarava que jamais viu o quadro do sacrifício de Isaac, sem que as lágrimas lhe viessem aos olhos, de modo que Basílio, bispo de Ancira, presente ao 2.° Concílio de Nicéia, comentava: “Muitas vezes este Padre tinha lido a história e não tinha chorado, mas, quando viu a pintura, chorou”. E outro Padre presente ao mesmo Concílio acrescentava: “Se a pintura produz tal efeito em um mestre, como não será útil aos ignorantes e aos simples!”

Compreende-se, portanto, muito bem, que quando Sereno, bispo de Marselha, temendo que se interpretasse mal o culto das imagens, quis proibi-las, o Papa São Gregório Magno (do século VI) que foi notável também pela sua grande cultura, o tenha repreendido, dizendo: “Aquilo que para os letrados é a escrita, é a pintura a ser vista pelos rudes, porque nela, mesmo os ignorantes vêem o que devem imitar; nela lêem os que não conhecem as letras” (Epístolas LIX, 105).

E diz também o Cardeal Gibbons: “As imagens religiosas podem ser consideradas como um catecismo para os rudes... Quando Agostinho, apóstolo da Inglaterra, apareceu pela primeira vez diante do rei Etelberto para pregar o Evangelho, foram postas diante do pregador imagens de Cristo pendente da cruz e outras imagens de Cristo Salvador, e elas foram mais eloquentes para os olhos dos ouvintes do que as palavras para os ouvidos”.

São João Damasceno escreve: “A beleza e a cor das imagens estimulam minha oração. É uma festa para os meus olhos, tanto quanto o espetáculo do campo estimula meu coração a dar glória a Deus”, e: “A contemplação dos ícones santos, associada à meditação da Palavra de Deus e ao canto dos hinos litúrgicos, entra na harmonia dos sinais da celebração para que o mistério celebrado se grave na memória do coração e se exprima em seguida na vida nova dos fiéis” (Catecismo da Igreja Católica).

Para que é que se fazem as estátuas dos grandes homens e se põem aos olhos de todos na praça pública? É para avivar sempre a sua memória e para que o exemplo de sua vida fique sempre patente diante de todos.

É o que acontece com as imagens de Nosso Senhor Jesus Cristo, de Maria Santíssima e dos santos nas nossas igrejas. Sem que ninguém precise fazer um sermão, elas estão continuamente relembrando seus protótipos, evocando a recordação daqueles que não devemos jamais esquecer e para copiarmos a santidade de suas vidas.

E aqui entra o protestante com o seu espírito pirrônico (que duvida de tudo): E quem pode garantir que aquilo é o retrato fiel de Jesus, de Maria ou dos santos?

Para que a imagem produza o bom resultado de nos despertar a lembrança do santo, não é necessário que seja a cópia fiel das feições do protótipo.

Estabeleceu-se na arte cristã de todos os tempos um sistema tradicional de representar o Divino Redentor, sua Santa Mãe e os santos, de tal modo que sem ser preciso colocar-se o nome no pedestal, o homem, mesmo rude, mesmo o camponês, sabe que aquela imagem é de Jesus, aquela de Maria Santíssima, aquela de São José, ou de São Pedro ou de Santo António etc. Isto é o bastante para que evoque imediatamente estas augustas pessoas, desperte a sua lembrança, excite demonstrações de respeito, amor e veneração por elas.

A bandeira do país suscita imediatamente no indivíduo a lembrança de sua Pátria querida. E para isto não é necessário que o brasileiro ou o alemão ou o japonês veja naquela bandeira a cópia fiel de sua Pátria. É um símbolo convencional que a representa, e é quanto basta para acender-lhe o entusiasmo patriótico.

O mesmo se dá com as imagens. Elas têm por fim: excitar a devoção, alimentar a piedade dos fiéis, transportar o seu pensamento para os protótipos que elas representam e provocar o desejo de imitá-los sinceramente na sua vida.

 

II

NOÇÃO DE ÍDOLO E DE IMAGEM

 

Quem vai entrar em discussão sobre uma questão qualquer (e principalmente quem vai lançar contra outrem uma grave acusação) precisa ter uma ideia bem clara sobre o significado dos termos que emprega nesta controvérsia ou nesta acusação. Discutir sem a exata noção dos termos seria obrigar os adversários a uma lamentável perda de tempo; acusar sem medir bem o alcance das palavras seria leviandade.

Ora, há protestantes (dizemos há protestantes, porque felizmente não são todos) que levam o seu ódio à Igreja Católica ao ponto de acusá-la de idolatria que, como a própria palavra está dizendo, consiste no culto de latria (ou seja, adoração no sentido rigoroso da palavra) prestada aos ídolos. É muito fácil verificar se é exata ou não esta acusação.

 

Afinal, o que vem a ser ídolo?

 

Ídolo é a figura representativa de um deus falso à qual se presta culto: “O Senhor é grande e digno de louvores infinitos e terrível mais que todos os deuses, porque todos os deuses das gentes são ídolos; mas o Senhor fez os Céus” (1 Cr 16, 25-26), e: “Eles reputaram por deuses a todos os ídolos das nações” (Sb 15, 15).

Sabemos que antes de Cristo, o mundo inteiro em peso caiu na idolatria, ou seja, adoração de estátuas de falsas divindades, as quais os homens consideravam como sendo o seu supremo senhor, mudando, como diz São Paulo, “a glória de Deus incorruptível em semelhança de figura de homem corruptível e de aves e de quadrúpedes e de serpentes” (Rm 1, 23). A única exceção a essa geral degenerescência da razão humana era o pequenino povo hebreu, o qual, entretanto, de vez em quando, pelo menos em parte, caía também neste grave pecado pela influência dos povos vizinhos, com os quais era obrigado a entrar em contato.

Conhecemos pela História a quantidade enorme desses falsos deuses e deusas, aos quais prestavam culto mesmo os povos mais civilizados, no desconhecimento em que se encontravam da existência do Deus único, Espiritual e Eterno. Como eram entre os romanos ou com outros nomes entre os gregos: Júpiter, Apolo, Mercúrio, Marte, Netuno, Saturno entre os deuses; e Juno, Vênus, Diana, Minerva, Vesta e Ceres entre as deusas. Como eram entre os egípcios: Amon, Osíris, Hórus, Anúbis, Isis, etc. Como eram na Mesopotâmia: Marduque, Assur, Samash, Sin, Istar, etc.

A Bíblia nos fala no nome de alguns destes ídolos adorados por povos vizinhos dos hebreus: Baal, Astarte, Moloc, Melcom, Camos... “Os filhos de Israel, ajuntando novos aos antigos pecados, fizeram o mal na presença do Senhor e adoraram os ídolos, a Baal e a Astarte, e os deuses da Síria e de Sidônia e do Moab” (Jz 10,6), e: “Salomão dava culto a astarte, deusa dos sidônios e a Melcom, ídolo dos amonitas” (1 Rs 11, 5), e também: “Edificou Salomão um templo a Camos, ídolo dos moabitas” (Idem., 11,7).

Ora, três coisas verdadeiramente absurdas se notavam nesta idolatria ou adoração dos ídolos.

A primeira é que se apresentavam como deuses, em contraposição com o único e verdadeiro Deus.

A segunda é que esses deuses não correspondiam a nenhuma realidade. Nunca existiu Júpiter, nem Baal, nem Vênus, etc. Era pura imaginação. É por isto que diz São Paulo: “... mudaram a verdade de Deus em mentira” (Rm 1, 25).

Sendo o culto desses deuses inteiramente mentiroso, prestado a seres completamente inexistentes e destinando-se assim a substituir a adoração do verdadeiro Deus, a Bíblia o apresenta como sendo prestado ao próprio demônio, pai da mentira, que fomentava no mundo esse culto ilusório para afastar os homens da verdadeira noção do Criador: “... os sacrifícios a eles oferecidos eram endereçados aos demônios: Eles O irritaram adorando deuses estranhos e com as suas abominações O provocaram à ira. Ofereceram sacrifícios, não a Deus, mas aos demônios, aos deuses que eles desconheciam” (Dt 32, 16-17), e: “Todos os deuses das gentes são demônios; mas o Senhor fez os Céus” (Sl 95, 5), e também: “E serviram aos seus ídolos e lhes foi causa de tropeço. E imolaram aos demônios os seus filhos e as suas filhas” (Idem., 105, 36-37), e ainda: “As coisas que sacrificam os gentios, as sacrificam aos demônios, e não a Deus” (l Cor 10, 20).

A terceira é que, não correspondendo esses ídolos a nenhuma realidade, os gentios que os adoravam, era daquelas estátuas em si mesmas que esperavam todo poder, toda proteção, de modo que estavam convencidos de que se desprendia daquele objeto material uma virtude, um poder mágico. E é assim que Deus pelo profeta Isaías comenta com ironia o absurdo de um homem que fabrica uma imagem e a considera como sendo o seu Deus: “O escultor estendeu a sua régua sobre o pau, ele o formou com o cepilho, pô-lo em esquadria, e com o compasso lhe deu as devidas proporções e fez dele uma imagem de varão, como um homem bem apessoado que habita numa casa. Cortou cedros, tomou uma azinheira e um carvalho que estivera entre as árvores dum bosque, plantou um pinheiro, que criou a chuva. E esta árvore serviu aos homens para o fogão; ele mesmo tomou parte das mencionadas árvores e com ela se aquentou e a acendeu e cozeu um par de pães; e do mais que ficou fez ele um deus e o adorou, fez uma estátua e prostrou-se diante dela. A metade deste pau, queimou ele no fogo e com a outra metade cozinhou as carnes que comeu; acabou de cozer as suas viandas e fartou-se delas e aquentou-se e disse: Bom, aquentei-me, já vi aceso o fogão. E do que ficou do mesmo pau fez ele para si um deus e um ídolo, diante ao qual se prostra, e o adora e lhe roga, dizendo: livra-me, porque tu és o meu deus” (Is 44, 13-17).

 

Até aqui a noção de ídolo. Passemos agora à de imagem.

 

Imagem é um termo de significação muito ampla. Quer dizer, a representação ou semelhança expressa de um ser qualquer. Não é só qualquer estátua ou desenho ou gravura; o sentido é tão vasto que quando nos lembramos de uma pessoa, dizemos trazer a sua imagem em nossa mente; ou quando o pregador usa de belas comparações, nós dizemos que ele emprega belas imagens, ou seja, umas ideias representando outras.

Mas, quando falamos, como agora é o caso, da questão do culto das imagens, entendemos por esta palavra as imagens sagradas, ou de pintura ou de escultura, que estão em uso na Igreja Católica.

São figuras representativas, não de falsos deuses, mas de Nosso Senhor Jesus Cristo, de sua Mãe Maria Santíssima, dos anjos e dos santos.

A Igreja Católica, espalhando no mundo as ideias cristãs desde os primeiros séculos, espalhou consequentemente a doutrina fundamental de que há um único e verdadeiro Deus, espiritual, invisível, imutável e eterno, criador de todas as coisas.

Mas é claro que todos os grandes personagens da História e todos os fatos relevantes para a humanidade têm fornecido assunto para as belas artes, como o desenho, a pintura e a escultura; nada mais natural, portanto, do que os artistas cristãos procurarem expressar os grandes personagens da História do Cristianismo, entre os quais avulta, é claro, Nosso Senhor Jesus Cristo, Homem-Deus, figura central de toda a História da humanidade. Com Ele, têm que ser relembrados os episódios sacrossantos da sua vida. Entre estes aparece, como um dos mais belos assuntos para a arte cristã, o seu nascimento em Belém e aí já é inseparável a sua Mãe Santíssima. Como também merecem a atenção dos artistas, os santos que ficam como um exemplo admirável para os homens pelo modo como souberam realizar em si as virtudes cristãs e espelhar na sua vida os ensinamentos de Jesus; bem como, segundo a nossa maneira de expressá-los, os anjos que são os mensageiros de Deus.

Ora, sabe-se muito bem que a imagem, a representação e o símbolo, valem não pelo que são materialmente em si, como seja um pedaço de pau ou de pano ou um aglomerado de gesso, mas valem muito aos nossos olhos em virtude daquilo que representam.

Portanto, querer confundir duas coisas tão diversas, como sejam: o ídolo, isto é, a representação de uma falsa divindade inventada pelos demônios, e a imagem, isto é, a representação de Nosso Senhor Jesus Cristo, de Maria Santíssima, dos anjos e santos sob o pretexto de que tudo não passa de pedaços de pau, de pano ou de gesso, isto é o mesmo que dizer que: o retrato de meu pai ou de minha mãe ou de meus irmãos – e o retrato de um cachorro vem a ser a mesma coisa, porque tudo isto não passa de um pedaço de papel onde pousou o material fotográfico; ou que a bandeira que simboliza a nossa querida Pátria – e o pano que serve para a cozinheira enxugar os pratos vem a ser a mesma coisa, porque tudo isto vem a ser apenas um simples pedaço de pano.

As imagens valem por aquilo que representam. Por isto os ídolos eram abomináveis, pois representavam os falsos deuses, que não passavam de invenções diabólicas para perdição dos homens. As nossas sagradas imagens são veneradas porque representam realidades que são dignas de todo o nosso respeito e consideração.

E os protestantes que querem tachar de ídolos as nossas imagens sagradas são refutados por outros seus companheiros de Reforma: porque há seitas, como os luteranos e anglicanos que têm nas suas igrejas imagens iguais às que estão em uso na Igreja Católica; se são ídolos abomináveis, por que os conservam nos seus templos?

 

III

NOÇÃO DE ADORAÇÃO E LATRIA

 

Nem as nossas imagens são ídolos, como acabamos de ver; nem também o culto que a elas prestamos é de latria ou de verdadeira adoração. É o que iremos provar.

Sabemos todos, católicos e protestantes, que só devemos adorar a Deus.

Mas o que não deixa de lançar certa confusão sobre o assunto é que a palavra adoração pode ter vários sentidos: existe a adoração impropriamente dita e a adoração propriamente dita.

Adorar, por exemplo, pode significar: querer bem, ter muita estima. Um pai pode dizer: Adoro os meus filhinhos. Um filho extremoso pode dizer: Adoro minha santa mãe. E, no entanto, não estão cometendo nenhum ato de ofensa a Deus, pois se adorar aí no caso quer dizer querer muito bem, então este pai tem obrigação mesmo de adorar os seus filhinhos, isto é, querer muito bem a eles; este filho tem obrigação de adorar a sua mãe, isto é, amá-la de todo o coração. Deus mesmo quer que seja assim; o erro só haverá se estas pessoas puserem o amor de seus filhinhos ou o amor de sua mãe acima do amor de Deus, que deve ser superior a todos os outros amores.

É comum ouvir esta expressão: uma criatura adorável, que ao pé da letra deveria indicar uma criatura digna de ser adorada, mas que, sem nenhuma blasfêmia exprime simplesmente isto: uma criatura que merece toda simpatia, benevolência e estima.

Na linguagem bíblica, no latim e também no português antigo, a palavra adorar tem igualmente o sentido de prosternar-se, isto é, ajoelhar-se com os dois joelhos e fazer uma inclinação de cabeça que pode ser mais ou menos profunda e que pode ser profunda até o ponto de se fazer chegar a cabeça até o chão. Existem vários sistemas de saudação entre os diversos povos, como sejam entre nós, por exemplo: tirar o chapéu, fazer uma inclinação de cabeça, dar um aperto de mão etc. Os orientais, muito mais pródigos e exagerados do que nós neste assunto de cumprimentos, costumavam diante de personagens muito ilustres, que mereciam grande respeito, levar a saudação até este ponto: a prosternação completa, isto é, não só de joelhos, mas também com muito profunda inclinação de cabeça. Daí não se segue que considerassem a pessoa que recebia tais saudações como se fosse uma divindade. Apenas o gesto significa isto: um profundo respeito.

Quando dizemos que só a Deus devemos adorar, não é tomando a palavra adorar no sentido de prosternar-se, pois esta adoração impropriamente dita aparece muito frequentemente na Bíblia, feita por pessoas dignas e servos de Deus a outras criaturas e nunca foi intenção da Bíblia fazer propaganda de idolatria: “Levantando, porém, Jacó os seus olhos, viu vir Esaú... E ele mesmo, adiantando-se o adorou sete vezes prostrado por terra até chegar a seu irmão... Chegou também Lia com seus meninos; e como o adorassem do mesmo modo, em último lugar o adoraram José e Raquel” (Gn 33, 1-3 . 7), e: “No mesmo ponto abriu o Senhor os olhos de Balaão, e ele viu o anjo parado no caminho com a espada desembainhada e prostrado por terra, o adorou” (Nm 22, 31), e também: “Josué viu um anjo em figura de homem e se lançou com o rosto em terra e adorando-o, disse: Que diz meu Senhor ao seu servo?” (Js 5, 14), e ainda: “Tendo-se, pois, apresentado ao rei esta mulher de Técua, deitou-se por terra diante dele e o adorou e disse: Salva-me, ó rei” (2 Sm 14, 4), e: “Joab, prostrando-se por terra sobre o seu rosto, adorou e felicitou ao rei” (2 Sm 14, 22), e também: “Inclinou-se Betsabéia profundamente e adorou o rei” (1 Rs 1, 16), e ainda: “Eliseu lhe disse: Toma o teu filho. Chegou-se ela e lançou-se a seus pés e o adorou prostrada em terra; e tomou seu filho e saiu” (2 Rs 4, 36-37), e: “E todo o povo bendisse o Senhor Deus de seus pais; e se prostraram e adoraram a Deus e depois ao rei” (1 Cr 29, 20).

Quando Cornélio, ao receber São Pedro, prostrando-se aos seus pés o adorou (At 10, 25) não praticou um ato pecaminoso de idolatria ou de culto divino prestado à criatura, pois Cornélio era homem justo e temente a Deus (At 10-22). Pedro, porém, lhe disse: “Levanta-te, que eu também sou homem” (At 10, 26). A extraordinária modéstia de São Pedro (mais realçada ainda pelo alto cargo que ocupava), a sua humildade profunda que conservou durante toda a vida, especialmente depois do pecado da negação, fazia com que o Apóstolo se sentisse incomodado ao ver alguém diante dele desmanchar-se em saudações tão rasgadas, quando ele, Pedro, era homem e também havia pecado.

Qual é, então, o conceito da verdadeira adoração, da adoração no sentido próprio (que se expressa pelo termo técnico latria) e que só a Deus é devida?

Latria ou adoração propriamente dita é o ato pelo qual se tributa homenagem a um ser, como ao Supremo Senhor de todas as coisas, ou em outras palavras, como tendo o supremo domínio sobre nós.

É um erro, por exemplo, dizer: ajoelhar-se diante de alguém ou de alguma coisa é adorar, é fazer ato de idolatria. Eu posso ajoelhar-me diante de meu pai, de minha mãe ou de uma pessoa qualquer para lhes pedir perdão de uma falta que cometi; daí não se segue que eu lhes esteja prestando a adoração que só a Deus é devida. Pois posso ajoelhar-me diante dessas pessoas, exclusivamente por um ato de humildade, sem considerar a nenhuma delas, como sendo o Supremo Senhor de todas as coisas. Nem mesmo, como vimos há pouco, o ato de ajoelhar-se e curvar a cabeça até o chão indica o culto de latria, pois os orientais faziam este gesto tão espetacular, simplesmente com a intenção de manifestar o profundo respeito que lhes inspirava aquela criatura.

O católico, no grande dia da Sexta-feira Santa, dia em que se comemora a morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, pode ajoelhar-se com os DOIS joelhos diante da cruz e inclinar a cabeça; isto apenas significa o grande respeito, a especial veneração que lhe merece a cruz do Divino Salvador, onde Ele remiu a humanidade; o seu pensamento se volta para o Calvário, onde se deu outrora a expiação infinitamente meritória de Cristo e quer com este ato homenagear a Cristo, que nos salvou. Não é o fato de chamar esta cerimônia adoração da cruz que torna isto um ato de idolatria; a palavra adoração é aí empregada no sentido de prosternação, assim como o verbo adorar é empregado muitas e muitas vezes na Bíblia, como vimos, no sentido de dobrar os joelhos com profunda inclinação do corpo: Jacó adorou a Esaú, Balaão adorou o anjo, Betsabéia adorou o rei, o povo adorou a Deus e depois ao rei, etc. Pode ser muito bronco e muito estúpido este católico; porém mesmo assim sabe muito bem que não são aqueles 2 pedaços de madeira atravessados um no outro que constituem o seu Deus, porque, como diz na sua linguagem simples e ingênua o nosso povo: “Deus está no Céu e na terra e em todo lugar onde se chamar por Ele”.

Por aí se vê que a adoração propriamente dita, ou seja, o culto de latria é um ato interno que se processa no nosso espírito, no nosso coração e ato pelo qual se reconhece aquele Ser, como nosso Supremo Senhor, como nosso Deus, a quem devemos a existência, a quem devemos tudo e de quem tudo esperamos.

Como somos criaturas compostas de alma e corpo, costumamos manifestar por atos exteriores os nossos sentimentos internos. Esta adoração a Deus podemos manifestá-la de diversas formas, mas entre estes atos externos só há um que por si mesmo, indica diretamente, necessariamente o culto de latria: é o sacrifício. Imolava-se a vítima precisamente para isto; para indicar com aquela vítima sacrificada, a qual morria ou desaparecia, que o Ser cultuado é o Supremo Senhor da vida e da morte. Por isso se explica muito bem que Paulo e Barnabé, confundidos em Listra, respectivamente, com os deuses Mercúrio e Júpiter, rasgassem as suas vestiduras e protestassem veementemente quando o sacerdote de Júpiter, que estava à entrada da cidade, trazendo para ante as portas touros e grinaldas, queria sacrificar com o povo (At 14, 12).

Diante dos ídolos, ou seja, dos deuses falsos, qualquer ato externo de homenagem que se fizesse, como seja, queimar incenso, ajoelhar-se ou simplesmente curvar a cabeça era um ato pecaminoso, porque aqueles ídolos eram apresentados como sendo deuses, como se tivesse qualquer um deles, ou sozinho ou de parceria com outros, o supremo domínio de todas as coisas. Quem lhes prestava culto o prestava diretamente àquela estátua, que não correspondia a nenhuma realidade e assim dava gosto ao demônio que se servia de tão abomináveis invenções para afastar os homens do culto do verdadeiro Deus, trazendo todos os povos pagãos na mais grosseira idolatria.

Quando, porém, nós católicos, que sabemos que existe só um Deus, que é Espiritual e Eterno, Supremo Senhor de todas as coisas e só a Ele prestamos o culto de latria, cercamos de carinho e veneração as sagradas imagens de Jesus Cristo, de Maria Santíssima e dos santos, a coisa é muito diversa. Não estamos diante de ídolos, ou de deuses falsos. Diante de uma imagem de Jesus Cristo, sabemos muito bem que não é aquela imagem, mas sim o seu protótipo, Jesus, que é o Supremo Senhor do Universo, Autor da Vida e da morte. Diante da imagem de Maria Santíssima e dos santos, sabemos muito bem que nem aquela imagem, nem o seu protótipo é o Supremo Senhor do Universo. Isto, porém, não nos impede de mostrar-lhes o nosso amor, de fazer-lhes as nossas súplicas diante destas venerandas representações e imagens que tanto nos excitam ao fervor e à devoção. E quando afirmamos categoricamente que não estamos prestando a estas imagens um culto de latria, é inútil que venham os protestantes teimar conosco, querendo convencer-nos de que o nosso culto é de verdadeira adoração. Pois a adoração é um sentimento interno, e os protestantes não podem saber melhor do que nós mesmos (e Deus) aquilo que realmente se passa no nosso íntimo, no interior do nosso coração.

 

IV

A ADORAÇÃO EM ESPÍRITO E VERDADE

 

E é precisamente porque a verdadeira adoração se processa no nosso íntimo, que Nosso Senhor disse estas palavras: “A hora vem, e agora é, quando os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade; porque tais quer também o Pai que sejam os que O adorem. Deus é espírito, e em espírito e verdade é que O devem adorar os que O adoram” (Jo 4, 23-24).

Nosso Senhor se refere aí à transformação que vem trazer o Cristianismo, substituindo-se àquela religião de meras exterioridades em que tinha caído o judaísmo: “Este povo honra-me com os lábios; mas o seu coração está longe de mim” (Mt 15, 8), e: “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que dizimais a hortelã, o endro e o cominho, e haveis deixado as coisas que são mais importantes da lei, a justiça, a misericórdia e a fé: estas coisas eram as que vós devíeis praticar sem que, entretanto, omitísseis aquelas outras” (Idem., 23, 23), e também: “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, porque limpais o que está por fora do copo e do prato, e por dentro estais cheios de rapinas e de imundícias” (Idem., 23, 25).

Apesar de praticarem muitos atos exteriores de religiosidade, não praticavam os judeus a verdadeira adoração; esta consiste em que a nossa alma esteja totalmente submissa a Deus: a nossa inteligência pela fé na sua Palavra infalível; o nosso coração pelo amor a Ele acima de todas as coisas; o nosso espírito pela resignação à sua vontade; toda a nossa vida pela exata observância dos seus mandamentos. Isto que é realmente reconhecer a Deus como Supremo Senhor nosso e Supremo Senhor de todas as coisas.

Verdadeiro adorador em qualquer época e em qualquer país é aquele que se acha no estado de graça santificante, isto é, em situação de amizade com Deus, com os seus pecados perdoados e com o firme propósito de jamais voltar a cometê-los. Porque aquele que está no estado de pecado mortal não pode dizer, em toda a extensão da palavra, que reconhece o supremo domínio de Deus sobre a sua alma; se reconhece em teoria, não quer reconhecê-lo na prática, nas suas ações, no seu modo de agir; antes se coloca sob a servidão do demônio, pois, como disse a Sabedoria Eterna: “Todo o que comete pecado é escravo do pecado” (Jo 8, 34). E é por isto que diz São Paulo a respeito daqueles que têm contaminadas tanto a sua mente como a sua consciência: “Eles confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com as obras” (Tt 1, 16).

A Igreja tem as belas cerimônias de sua liturgia, para a qual contribuem todas as artes: arquitetura, pintura, escultura, música, eloquência, etc., todas a serviço do sentimento religioso que ela procura infundir nos seus filhos fiéis. Aliás, o centro de toda a liturgia é Jesus Cristo realmente presente na Hóstia Consagrada, que é objeto da nossa adoração e do culto de latria, porque é a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade.

Mas, ao mesmo tempo em que nos emociona com as suas cerimônias, ela nos lembra sempre que isto é um meio e não um fim; ela quer, sobretudo, chegar à purificação da alma e a sua total dedicação a Deus. Esta purificação da alma se opera com a confissão bem feita, a qual só é possível quando o cristão não só está sinceramente arrependido de seus pecados, mas está sinceramente resolvido, custe o que custar, a jamais voltar a cometê-los. Recuperando assim a graça santificante que havia recebido no Batismo, o católico se habilita a ser um verdadeiro adorador numa total submissão a Deus, e quanto mais santo for interiormente, tanto mais perfeita será a sua adoração. Por isto a Igreja obriga os fiéis a se confessarem ao menos uma vez cada ano; e insiste sempre pela prática da confissão frequente e da comunhão, até mesmo quotidiana.

E nos meios eclesiásticos é considerado o povo mais católico, não aquele em que maior número de pessoas comparece à igreja, mas aquele em que maior número de pessoas, devidamente preparadas pela confissão bem feita, se aproximam da mesa eucarística. Se nesse meio vai alguém que não o faz com a devida sinceridade, não temos o poder de adivinhar o que se passa no coração dos outros; mas já é um sinal de que Deus conhece os verdadeiros adoradores... e a adoração é uma coisa toda interna.

Os protestantes, no seu velho sistema de interpretar as passagens da Bíblia, tendo, antes de tudo, o pensamento de ver em cada uma delas um meio de censurar e combater a Igreja Católica; tomam a palavra de Jesus no sentido de que está condenado todo e qualquer culto externo e ficam satisfeitos com a ideia de que, tendo as paredes de suas igrejas completamente nuas e não tendo cerimônias impressionantes como o Catolicismo, são eles os únicos verdadeiros adoradores a que se refere Jesus.

Mas é o caso de perguntar: será isto que resolve a questão? Se adorar é reconhecer o supremo domínio de Deus, é reconhecer a Deus como Supremo Senhor da nossa inteligência, do nosso coração, da nossa vida; suponhamos que um protestante, com esta ampla autorização que tem, pelo livre exame de interpretar a Bíblia como bem entende, se põe a torcer a palavra de Deus diante de uma doutrina de Jesus em que não quer acreditar. Será um verdadeiro adorador? Não; porque não quer reconhecer a Deus como Supremo Senhor de sua inteligência... em vez de adorar a Deus, Verdade Infalível, adora o ídolo de sua opinião própria. Nem venham os protestantes afirmar que ninguém no Protestantismo torce as palavras da Bíblia. Eles próprios têm que reconhecer que existe no seu seio quem o faça. Pois se há seitas que crêem na Santíssima Trindade e outras que a negam; se há seitas que admitem a divindade de Jesus e outras que a rejeitam; se há seitas que admitem a existência do inferno, a presença real de Jesus Cristo na Eucaristia, a necessidade das boas obras para a salvação, a indissolubilidade do matrimônio, a imortalidade da alma, a sobrenaturalidade da graça etc., e há outras que negam estes pontos, é sinal de que aí neste meio há gente torcendo o sentido da Bíblia, a não ser que Cristo tenha falado de maneira duvidosa exclusivamente para isto, para sua doutrina andar sempre assim numa eterna discussão. Ora, isto é claramente inadmissível.

Suponhamos que mesmo com suas igrejas de paredes branqueadas e com a ausência de cerimônias litúrgicas, haja um protestante que vive enganando os outros em matéria de dinheiro, ou que vive escravizado a uma paixão carnal e desonesta. Será um verdadeiro adorador? Não; porque São Paulo é o primeiro a nos dizer que há pecados que equivalem ao culto dos ídolos: “Nenhum fornicador ou imundo, ou avaro, que é idólatra, não tem herança no reino de Cristo e de Deus” (Ef 5, 5).

Não é nosso intuito com estas hipóteses humilhar nem ofender aos protestantes. Absolutamente não! Há católicos errados e há protestantes errados; é a consequência inevitável da fragilidade humana. Mas quererem alguns insinuar que todo homem, abraçando uma seita chamada “evangélica” se torna ipso facto uma criatura angélica e impecável, que no seio do Protestantismo só há puros e perfeitos, que o cristão logo que se convence que já está salvo por Jesus, se torna uma nova criatura modelo de virtudes, isto é conversa para boi dormir. Nesta canoa ninguém embarca. E quanto à Igreja Católica, ela mesma é que ensina os seus filhos a rezar assim: pequei, Senhor, muitas vezes por pensamentos, palavras e obras, por minha culpa, por minha culpa, por minha tão grande culpa!

O que queremos frisar aqui é simplesmente isto: que não é o fato de frequentar igrejas lisas ou de não assistir a cerimônias litúrgicas que faz de um homem um verdadeiro adorador. E que a adoração é uma coisa interna, é um sentimento da alma e do coração, é o reconhecimento, no nosso íntimo, do supremo domínio do Ser a quem nós adoramos. Não é o fato de nos ajoelharmos, de nos curvarmos, de trazermos ofertas ou de acendermos velas que constitui a adoração.

E o católico, por mais rude e ignorante que seja, sabe muito bem que não é aquela imagem que está no altar, a qual não vê, não sente, não ouve, não fala, não tem inteligência, nem sensibilidade... não é aquela imagem que tem o supremo domínio sobre a sua alma e sobre a sua vida. Se os pagãos caíram neste erro tão grosseiro a respeito de seus ídolos, isto mostra apenas a degenerescência em que tinha caído a razão humana antes da doutrinação de Jesus Cristo, o que serviu para mostrar quanto era necessária a vinda do Salvador.

Sabe muito bem o católico que não é aquela imagem que o ouve, nem que o socorre; mas ela serve para ele erguer melhor o seu pensamento ao protótipo que ela representa. E assim como ficaríamos alegres se soubéssemos que alguém cercou de flores o nosso retrato ou quis diante dele render-nos carinhosa homenagem. Jesus Cristo, a Virgem Maria e os santos só podem receber com agrado as homenagens que lhes prestamos diante de suas sagradas e venerandas imagens que tão insistentemente estão avivando aos nossos olhos a sua memória e a sua recordação.

 

V

LEI DE DEUS A QUE ESTAMOS SUJEITOS

 

Finalmente, antes de examinarmos o texto da Bíblia que os protestantes apresentam pretendendo demonstrar com ele que é contrário à lei de Deus o culto que os católicos prestam às imagens, é preciso relembrar que a lei de Deus ou se entende lei natural que todo homem traz na sua consciência e no seu coração, ou lei mosaica dada aos judeus, ou lei cristã que nos é imposta por Nosso Senhor Jesus Cristo no Novo Testamento.

A lei natural proíbe a idolatria. Mesmo independentemente da fé, a razão nos diz que só existe um Deus o qual fez todas as coisas e só a Ele é que podemos adorar, isto é, reconhecê-Lo como supremo Senhor de todas as coisas. Mas não nos proíbe homenagear um homem ilustre através de sua estátua, desde que esta veneração à estátua não consiste em adorá-la, como se fosse um Deus. Logo, a lei natural não proíbe o culto das imagens, como é praticado na Igreja Católica.

Quanto à lei mosaica, já sabemos que foi abolida (At 15, 5-29).

Não se pode, por conseguinte, apresentar o uso e o culto das imagens como condenados por Deus, só pelo fato de que tenham sido proibidos no Antigo Testamento, na lei de Moisés. Como se prova que tudo o que era proibido aos judeus no Antigo Testamento é proibido também a nós? A usar deste argumento, deveriam os protestantes ensinar que nos é proibido comer carne de lebre, de camelo ou de porco, bem como todos os peixes que não tenham barbatanas nem escamas (Dt 14, 7-8. 10), que é proibido lavrar com boi e burro ao mesmo tempo, ou vestir qualquer tecido de lã com linho (Idem., 22, 10-11), que é proibido ao filho bastardo entrar na congregação do Senhor até a décima geração (Idem., 23, 2), ou rapar a barba (Lv 19, 27) etc. Tudo isto está proibido pela Bíblia no Antigo Testamento, mas estas leis não nos atingem.

A Lei Antiga está cheia também de preceitos que não vigoram mais, como a circuncisão, bem como cerimônias especiais para a mulher que dá à luz (Idem., 12, 8) etc.

E é conhecida a luta de São Paulo contra os judaizantes que queriam à fina força obrigar os cristãos a obedecer a lei de Moisés que havia sido abolida.

Para provar, portanto, que a nós, cristãos, é proibido o culto das imagens, é preciso provar que ele é proibido pela lei de Cristo.

– Pois é precisamente o que vamos fazer, dirão os protestantes.

O culto das imagens é proibido nos 10 mandamentos. Ora, os dez mandamentos fazem parte da lei de Cristo, porque Nosso Senhor disse ao moço do Evangelho: “Se tu queres entrar na vida, guarda os mandamentos” (Mt 19, 17). Logo, o culto das imagens é proibido pela lei de Cristo.

– É o caso de dizer: Deste versículo da Bíblia, que encerra a palavra infalível de Jesus, vocês se lembram agora, porque querem acusar os católicos de transgredir um mandamento; por que não se lembram dele quando vivem a pregar que só a fé, e não a observância dos mandamentos, é necessária para a salvação?

Sim, os 10 mandamentos estão de pé na lei cristã, não há dúvida alguma; não, porém, na mesma forma ou com os mesmos termos em que vigoraram para os judeus outrora, pois o Divino Mestre refundiu e aperfeiçoou os preceitos do Decálogo. É o que demonstraremos daqui a pouco. Antes, porém, queremos ver como é que vocês, protestantes, nos provam que o uso e o culto das imagens, tal qual se observam na Igreja Católica, são condenados pelo texto dos 10 mandamentos.

Examinemos:

 

O TEXTO DO ÊXODO

 

Para o nosso caso, esse texto não tem nenhuma diferença do texto do Deuteronômio 5, 7-9.

Versículo 3. Não terás deuses estrangeiros diante de mim. Versículo 4. Não farás para ti IMAGEM DE ESCULTURA, NEM FIGURA ALGUMA DE TUDO O QUE HÁ EM CIMA NO CÉU E DO QUE HÁ EMBAIXO NA TERRA, NEM DE COISA QUE HAJA NAS ÁGUAS DEBAIXO DA TERRA. Versículo 5. NÃO AS ADORARÁS NEM LHES DARÁS CULTO, porque eu sou o Senhor teu Deus, o Deus forte e zeloso que vinga a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem (Ex 20, 3-5).

 

VERSÍCULOS 3.° e 4.°.

 

Vê-se claramente que estas imagens de que Deus fala no versículo 4.° são as imagens dos deuses estrangeiros de que falou no versículo 3.°. Se no versículo 4.° Deus diz que não façam imagem de escultura, NEM FIGURA DE COISA ALGUMA QUE HAJA OU NO CÉU, OU NA TERRA OU NAS ÁGUAS, entende-se que Deus não fala aí de qualquer espécie de desenho ou de pintura ou de escultura (assim estaria proibindo até o termos em casa o retrato de nossos pais, ou qualquer pintura decorativa representando flores ou peixes ou frutos etc.), mas sim, de ídolos e de figuras de deuses falsos. Estes ídolos tomavam aqui e acolá inúmeras formas de pessoas, ou de animais, ou de astros, ou de outras coisas. Tudo era deus, exceto o próprio Deus, como disse Bossuet. Por isto Deus proíbe os deuses estrangeiros, SEJA QUAL FOR A FORMA SOB A QUAL ELES SE APRESENTEM.

Somente quem possui o VENENO da CALÚNIA na língua é que finge não entender essa passagem bíblica.

E a prova de que Deus aí não se refere a qualquer imagem, a qualquer pintura e a qualquer semelhança, está no fato de que Deus mesmo mandou Moisés fazer uma serpente de metal (se há proibição de fazer qualquer figura ou semelhança de tudo que há em cima no céu, e do que há embaixo na terra, a serpente é um animal que há embaixo na terra). E o Senhor lhe disse: “Faze uma serpente de metal e põe-na por sinal: todo o que sendo ferido olhar para ela, viverá. Fez, pois, Moisés uma serpente de metal e pô-la por sinal aos que, estando feridos, olhavam para ela, saravam” (Nm 21, 8-9).

Esta imagem de serpente em escultura era prefigurativa de Jesus pregado na cruz: “Como Moisés no deserto levantou a serpente, assim importa que seja levantado o Filho do Homem, para que todo o que crê n’Ele não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 14-15).

Por que, então, Jesus Cristo não disse que aquela SERPENTE de BRONZE era uma idolatria?

Deus mandou Moisés fazer também dois querubins de ouro (portanto imagens de anjos em escultura) para cobrirem o propiciatório: “Farás também dois querubins de ouro trabalhados ao martelo, nas duas extremidades do oráculo. Um querubim estará a um lado, outro ao outro. Cubram ambos os lados do propiciatório com asas estendidas, e cobrindo o oráculo estarão olhando um para o outro com os rostos virados para o propiciatório, com o qual se cobrirá a arca” (Ex 25, 18-20).

Salomão, quando construiu o templo, mandou também fazer, por sua própria conta e risco, alguns querubins, bem como diversas figuras na parede: “E pôs no oráculo dois querubins de pau de oliveira de dez côvados de altura... Cobriu também de ouro os querubins; e fez esculpir todas as paredes do templo em roda de entalhes e molduras, e nelas fez querubins e palmas e diversas figuras, como sobrepujando e saindo da parede” (1 Rs 6, 23. 28-29). Entre estas figuras que havia no templo, estavam leões e bois que são animais que existem aqui embaixo na terra: “E entre as coroas e laçadas havia leões, bois e querubins” (Idem., 7, 29).

Ora, isto não foi do desagrado de Deus, pois quando Salomão terminou o templo e fez para lá a solene trasladação da arca, aconteceu que, logo que os sacerdotes saíram do santuário, uma névoa encheu a casa do Senhor; e os sacerdotes não podiam ter-se em pé nem fazer as funções do seu ministério por causa da névoa, porque a glória do Senhor tinha enchido a casa do Senhor. Então disse Salomão: “O Senhor disse que Ele habitaria numa névoa” (Idem., 8, 10-12).

Portanto, quando os protestantes dizem, procurando impressionar as pessoas simples: Os católicos estão contra a Bíblia, porque a Bíblia proíbe fazer imagens e eles fazem imagens de Jesus Cristo, de Maria Santíssima, dos anjos e dos santos; trata-se de uma acusação muito fora de propósito. Deus proibiu aí no texto do Êxodo fazer imagens dos deuses estrangeiros, pois é dos deuses estrangeiros que Ele está falando. E a prova é que Ele mesmo mandou fazer outras imagens e Deus não cai em contradição consigo mesmo. Nem se concebe que Deus, tendo horror a quaisquer imagens, como querem os protestantes, fosse o primeiro a mandar fabricá-las.

E basta ler com atenção o Pentateuco, se não quisermos falar em todo o Antigo Testamento, para ver como a grande preocupação, se assim se pode dizer de Deus, era fazer com que aquele povo pequenino, como era o seu povo escolhido, cercado como estava de tantos povos idólatras, pois o eram todas as nações do mundo, não se deixasse contaminar pelo exemplo dos outros adorando os deuses estranhos: “Lançai fora os deuses estranhos que estão no meio de nós” (Gn 35, 2), e: “Não fareis para vós deuses de prata nem deuses de ouro” (Ex 20, 23), e também: “O meu anjo caminhará diante de ti e ele te introduzirá na terra dos amorreus, dos heteus, dos ferezeus, dos cananeus, dos heveus, dos jebuseus, os quais eu destruirei. Não adorarás os seus deuses nem lhes darás culto, não imitarás as suas obras, mas destruí-los-ás e quebrarás as suas estátuas” (Idem., 23, 23-24), e ainda: “Eu entregarei nas vossas mãos os habitantes da terra e os expulsarei da vossa vista... Não habitem na tua terra, para que te não façam pecar contra mim, servindo aos seus deuses” (Idem., 23, 31-33), e: “Não adores a deus alheio. O Senhor tem por nome Zelador, Deus é zeloso” (Idem., 34, 14), e também: “Não vos volteis para os ídolos, nem façais para vós deuses fundidos. Eu sou o Senhor vosso Deus” (Lv 19, 4), e ainda: “Não seguireis os deuses estrangeiros de alguma das nações que estão à roda de vós” (Dt 6, 14), e: “Se esquecendo-te, porém, do Senhor teu Deus, seguires deuses estranhos e os servires e adorares, eu desde agora te denuncio que perecerás de todo” (Idem., 8, 19), e também: “E lá servirás a deuses estranhos, ao pau e à pedra; e ver-te-ás na última miséria, como o ludíbrio e a fábula de todos os povos, onde o Senhor te houver levado” (Idem., 28, 36-37), e ainda: “Eles O irritaram adorando deuses estranhos e com as suas abominações O provocaram à ira” (Idem., 32, 16).

 

VERSÍCULO 5.°

 

Vejamos agora o versículo 5.°: “Não as adorarás, nem lhes prestarás culto, porque eu sou o Senhor teu Deus, o Deus forte e zeloso que vinga a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem” (Ex 20, 5).

Já que o versículo 3.° se refere aos deuses estrangeiros: “Não terás deuses estrangeiros diante de mim” (Idem., 20, 3).

Já que o versículo 4.° : “Não farás para ti imagem de escultura, NEM FIGURA ALGUMA DE TUDO O QUE HÁ EM CIMA NO CÉU E DO QUE HÁ EMBAIXO NA TERRA, NEM DE COISA QUE HAJA NAS ÁGUAS DEBAIXO DA TERRA” (Idem., 20, 4), como já provamos, se refere a imagens de escultura ou figuras destes mesmos deuses estrangeiros; está claro que a proibição de prestar culto que lemos no versículo 5.° : “Não as adorarás, nem lhes darás culto” (Idem., 20, 5) se refere a imagens ou figuras destes mesmos deuses pagãos. Bastam os pronomes as, lhes para nos mostrar que é àquelas imagens de que fala o versículo anterior que é proibido prestar culto. No versículo anterior, Deus proibiu fazer tais ídolos. Mas podia acontecer que os judeus, nas suas viagens ou recebendo visitas de gente de outros povos, se deparassem com tais ídolos que eles, judeus, não tinham fabricado, mas que foram feitos pelos outros. Ou podia acontecer que alguém, mesmo no seio do povo israelita, teimasse em fazer tais ídolos. Neste caso era preciso que soubessem os judeus que também lhes estava proibido, tanto o adorá-los como o prestar-lhes qualquer culto.

E a prova de que Deus se refere a estes ídolos, a estas representações de deuses estranhos, está na razão que Deus lhes apresenta: “Não as adorarás, nem lhes darás culto, porque eu sou o Senhor teu Deus” (Idem., 20, 5). O que mostra muito bem que, sendo Ele o único Deus dos israelitas, não quer entrar em pé de igualdade com deuses estranhos, nem quer ser substituído por eles.

Os protestantes provariam que aí Deus está proibindo aos católicos fazer imagens de Jesus Cristo, de Maria Santíssima e dos anjos e santos e reverenciá-las, se conseguissem provar que estas imagens, venerandas e sagradas pelas pessoas que representam, são imagens daqueles deuses estrangeiros, que eram pura invenção do demônio, para afastar os homens do culto do Deus verdadeiro, culto este que nós, católicos, Lhe prestamos, reconhecendo o Seu supremo domínio sobre todas as coisas e reservando a Ele, só a Ele, o culto de latria, ou seja, de verdadeira adoração. Nós não substituímos o culto de Deus pelo de outros deuses nem pelo de nenhuma criatura.

Diante, portanto, da legítima interpretação do texto, não há aí nenhuma proibição do culto das imagens, tal como é compreendido e praticado pela Igreja que Cristo fundou, ou seja, a Igreja Católica.

 

VI

A INTERPRETAÇÃO PROTESTANTE

 

Analisemos agora a interpretação que os protestantes dão ao texto.

Não é a interpretação verdadeira; mas ainda mesmo que o fosse, a proibição contida neste texto do Antigo Testamento não nos atingiria, assim como eles também não se sentem atingidos por ela. É o que iremos provar.

Os protestantes separam completamente os dois versículos: “Não terás deuses estrangeiros diante de mim” (Ex 20, 3) é uma ordem.

“Não farás para ti imagem de escultura, nem figura alguma de tudo O QUE HÁ EM CIMA NO CÉU E DO QUE HÁ EMBAIXO NA TERRA, NEM DE COISA que haja nas águas debaixo da terra” (Idem., 20, 4) é outra ordem que nada tem a ver com o versículo anterior.

Aqui o homem rude logo se atrapalha com o sentido da palavra imagem; e desta confusão se aproveita o protestante.

Hoje, quando falamos em imagem, logo nos lembramos das imagens sagradas que vemos nas igrejas católicas. Era justamente o que não existia naquele tempo. Não havia imagem de Jesus Cristo, nem da Virgem Maria, nem de São Pedro ou de Santo Antônio ou de São Francisco ... por uma razão muito simples: nem Jesus Cristo como homem, nem Maria Santíssima, nem nenhum desses santos existia ainda. Havia, sim, os anjos, dos quais, como vimos, Deus mesmo mandou fazer imagens.

Imagem aí no texto se toma no sentido geral: representação de um ser mostrando-lhe a semelhança. Uma imagem de escultura é, por exemplo, a estátua de um homem; é um animal qualquer: um cachorro, um elefante, um carneiro feito de gesso, de madeira, de prata ou de ouro etc.

Desde que acha o protestante que também para nós está proibido fazer qualquer imagem de escultura, então estão proibidas todas as estátuas. São condenadas pela lei de Deus... É preciso acabar com elas... São proibidos todos os animais feitos por escultura. Entrando numa casa, onde encontra na sala um gato ou um leão ou um boi fabricado em gesso ou em madeira ou em metal, o “evangélico” deve protestar indignado; porque toda imagem de escultura é proibida por Deus. Tem que acabar, portanto, a profissão de escultor, como sendo uma profissão de homens rebeldes e pecadores que vivem fazendo justamente aquilo que Deus proíbe no seu mandamento.

Mas não são somente os escultores que entram na dança; entram também todos os pintores, desenhistas, gravadores e fotógrafos, porque o texto não proíbe somente qualquer imagem de escultura, mas proíbe qualquer figura, seja de criaturas humanas, seja de astros, seja de animais ou de plantas, seja lá do que for, pois continua assim: “NEM FIGURA ALGUMA DE TUDO O QUE HÁ EM CIMA NO CÉU E DO QUE HÁ EMBAIXO NA TERRA, NEM DE COISA QUE HAJA NAS ÁGUAS” (Idem., 20, 4).

Entrando no atelier de um pintor e encontrando-o a pintar uma figura humana, o protestante terá que dizer: É proibido; não podes fazer isto.

E se ele disser: Ao menos, deixe-me pintar um peixe ou outro animal qualquer, uma planta; ao menos, uma flor.

Não; nada disto é permitido. Não se pode fazer a figura de coisa alguma: nada do que há embaixo na terra, nada do que há nas águas.

Os livros ilustrados, bem como as fotografias, as gravuras, os desenhos que aparecem nas revistas ou jornais, bons ou maus, todos são proibidos.

Ora, esta interpretação é evidentemente absurda.

Não foi assim; Deus só proibiu fazer figuras de deuses estrangeiros, fosse qual fosse a forma sob a qual se apresentassem.

E mesmo que se quisesse dizer que Deus falava sobre qualquer imagem ou figura em geral, ainda se podia conceber que houvesse esta proibição para os judeus num tempo em que não havia ainda imprensa nem fotógrafos. Podia-se ainda imaginar que Deus, diante do grande perigo em que estavam os judeus de cair na idolatria pelo exemplo dos povos vizinhos, proibisse a este pequenino povo a arte dos pintores e dos escultores, a fim de se evitar a ocasião de pecado. Seria então um preceito positivo só para eles e ocasionado pelas circunstâncias. Mas querer fazer daí um preceito geral para todos os tempos, mesmo para os povos cristãos e civilizados que não estão mais, pelo simples fato de ver uma pintura ou uma estátua, em perigo de cair na idolatria, seria evidentemente cair no ridículo.

O protestante, portanto, se não quer admitir que este versículo 4.° se refere aos deuses estrangeiros, mencionados no versículo precedente, fazendo parte, portanto, da lei natural, como é em geral todo o Decálogo, tem que admitir que se trata de um preceito positivo só para os judeus. A não ser que queira apresentar como abomináveis e condenadas por Deus todas as estátuas, todos os objetos de adorno em forma de figuras humanas ou de animais, todos os brinquedos de criança feitos no mesmo sistema, todas as pinturas, todas as gravuras de livros, todas as fotografias...

 

AINDA O VERSÍCULO 5.°

 

Mas dirá o protestante: Deus não proíbe somente fazer imagens. Proíbe prestar-lhes culto no versículo 5.°: “Não as adorarás, nem lhes darás culto” (Ex 20, 5) e os católicos prestam culto às imagens.

– É o caso de perguntar: Se você é obrigado a admitir (para não cair no ridículo) que o versículo 4.° é endereçado só aos judeus, como pode provar agora que o versículo 5.°, ou seja, a proibição de prestar culto às imagens não é também um preceito só para eles? Este versículo 5.° está, não só logicamente, mas também gramaticalmente ligado ao versículo 4.°. Um preceito que era só para os judeus não nos atinge a nós cristãos.

 

VII

OS DEZ MANDAMENTOS

 

Os dez mandamentos sempre estiveram, estão e estarão de pé para todos os homens, ou se achem estes sob a lei natural, ou sob a lei mosaica, ou sob a lei de Cristo.

Mas assim como não vigoram da mesma forma sob a lei natural como à luz da revelação (neste último caso são conhecidos com mais nitidez), assim também não vigoram para nós, cristãos, exatamente da mesma forma em que vigoravam para os judeus. Estão em vigor na forma em que nos são propostos no Evangelho por Nosso Senhor Jesus Cristo, que é o nosso Legislador e nosso Mestre.

Há, então, diferença entre os mandamentos de Deus, tais quais foram impostos aos judeus e tais quais nos são ensinados por Jesus Cristo?

É claro que sim; pois o Divino Mestre refundiu e aperfeiçoou os preceitos do Decálogo.

Consideremos, por exemplo, a questão do descanso semanal. Era preceituado com muito rigor na Lei Antiga. E os protestantes devem reconhecer, pela leitura do Evangelho, como Jesus Cristo dá uma nova interpretação à lei do repouso no dia do Senhor, lei que permanece, porém de maneira mais benigna, pois o Mestre nos ensina que o preceito da caridade é superior a ela: “Logo, é licito fazer bem nos dias de sábado” (Mt 12, 12), e: “O sábado foi feito em contemplação ao homem, e não o homem em contemplação do sábado” (Mc 2, 27).

Já o contrário se dá com o 5.° mandamento que dizia simplesmente: “Não matarás” (Ex 20, 13) e agora se tornou muito mais rigoroso. Na Lei Antiga se permitia que se tivesse ódio aos inimigos, ódio aos gentios, pois Nosso Senhor, como se vê pela parábola do Samaritano (Lc 10, 29-37) é que veio alargar a noção da palavra: O próximo. Na Lei Nova de Nosso Senhor Jesus Cristo não se proíbe só o matar, proíbe-se qualquer sentimento de ódio contra o próximo, sendo o próximo qualquer pessoa: “Ouvistes que foi dito aos antigos: não matarás e quem matar será réu no juízo. Pois eu digo-vos que todo o que se ira contra seu irmão será réu no juízo” (Mt 5, 21-22), e: “Tendes ouvido que foi dito: Amarás ao teu próximo e aborrecerás a teu inimigo. Mas eu vos digo: Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos têm ódio e orai pelos que vos perseguem e caluniam para serdes filhos de vosso Pai que está nos Céus” (Idem., 5, 43-45).

O mesmo se dá com o preceito da castidade que se torna muito mais rígido. O texto do Êxodo que cita os protestantes e que traz os mandamentos diz simplesmente: “Não fornicarás” (Ex 20, 14). Fala somente sobre os pecados de ação. Jesus nos mostra no Evangelho que são condenados até os pecados por pensamento: “Ouvistes que foi dito aos antigos: não adulterarás. Eu, porém, digo-vos que todo o que olhar para uma mulher cobiçando-a, já no seu coração adulterou com ela” (Mt 5, 27-28).

O 4.° mandamento é proposto no Êxodo com uma promessa que só vale para os judeus, promessa de vida longa na terra que lhes era reservada, promessa esta que não está vigorando, é claro, para nós, pois as promessas do Novo Testamento são de vida eterna: “Honrarás a teu pai e a tua mãe para teres uma dilatada vida sobre a terra que o Senhor teu Deus te há de dar” (Ex 20, 12).

Agora perguntamos: Já que o assunto de que falamos é o 1.° mandamento; quando indagavam a Nosso Senhor Jesus Cristo, Legislador e Salvador nosso, que nos veio trazer a sua lei, que veio aperfeiçoar a lei de Moisés, qual era o primeiro e o mais importante mandamento da lei, Nosso Senhor respondia assim: “Não terás deuses estrangeiros diante de mim. Não farás para ti imagem de escultura, nem figura alguma de tudo o que há em cima no céu e do que há embaixo na terra, nem de coisa que haja nas águas debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhes darás culto?” (Idem., 20, 3-5). Não. Havia um preceito muito mais importante do que este. Não ter outros deuses, não cometer idolatria ainda é muito pouco.

O moço a quem Jesus disse: “Se tu queres entrar na vida, guarda os mandamentos” (Mt 19, 17). Pergunta-Lhe quais são estes mandamentos. O Mestre, para identificá-los, diz: “Não cometerás homicídio; não adulterarás; não cometerás furto; não dirás falso testemunho; honra teu pai e a tua mãe e amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Idem., 19, 18-19).

Às prescrições do capítulo 20 do Êxodo, Jesus ajunta um precioso versículo do Levítico (19, 18): “Amarás a teu próximo como a ti mesmo” – que vai ter um papel de relevância na Nova Lei, mas nenhuma alusão faz aos primeiros mandamentos (e os mais importantes) referentes a Deus, não que estes mandamentos fossem abolidos, mas porque na Nova Lei tomam redação melhor e mais perfeita, não já do capítulo 20 do Êxodo, mas de outra parte do Antigo Testamento (Dt 6,5).

Quando perguntavam a Nosso Senhor qual era o primeiro e o máximo mandamento, Ele respondia, como respondeu ao doutor da lei: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o máximo e o primeiro mandamento. E o segundo semelhante a este é: Amarás a teu próximo como a ti mesmo” (Mt 22, 37-39).

Em outra ocasião, o Divino Mestre louva a outro doutor da lei que aponta como, meio para entrar na posse da vida eterna, a observância destes grandes mandamentos: “E eis que se levantou um doutor da lei e Lhe disse para O tentar: Mestre, que hei de fazer para entrar na posse da vida eterna? Disse-lhe então Jesus: Que é o que está escrito na lei? Como lês tu? Ele, respondendo, disse: Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração e de toda a tua alma e de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e ao próximo como a ti mesmo. E Jesus lhe disse: respondeste bem; faze isso e viverás” (Lc 10, 25-28).

Ninguém pode deixar de ver a superioridade deste mandamento: Amar a Deus de todo o coração, de toda a alma, com todo o entendimentosobre o outro: Não ter deuses estrangeiros, não fazer imagens de escultura etc. Está se vendo que este último foi inculcado aos judeus a fim de chamar-lhes bem a atenção para não caírem na idolatria, à maneira dos povos vizinhos, mas o mandamento do amor a Deus sobre todas as coisas não só inclui a repulsa à idolatria, senão também a submissão de todo o nosso ser e de toda a nossa alma aos ensinamentos de Deus.

Devo amar a Deus de todo o coração e ao próximo como a mim mesmo. Se cometo idolatria, se adoro deuses falsos, se adoro outro ser que não seja Deus, estou pecando contra este mandamento, não O estou amando sobre todas as coisas.

Mas, se eu amo a Jesus Cristo, a Maria Santíssima que foi sua Mãe, a qual eu considero grande justamente por isto, porque foi mãe de Jesus, se eu amo os santos que foram em vida o bom cheiro de Cristo (2 Cor 2, 15), que de tal modo imitaram o Mestre que bem podiam dizer como São Paulo: “Não sou eu já o que vivo; mas Cristo é que vive em mim” (Gl 2, 20), se pelo amor que tenho a Jesus Cristo, a Maria Santíssima e aos santos, trato com carinho, veneração e respeito as imagens que os representam e simbolizam (imagens estas que valem muito para mim, assim como o retrato de um pai, de uma mãe ou de um irmão muito vale aos nossos olhos ou assim como a bandeira da nossa Pátria, mesmo sendo um simples pedaço de pano, também tem grande valor para nós pelo que ela simboliza), com esta veneração, respeito e acatamento que tenho às imagens não estou de maneira alguma faltando ao amor a Deus; ao contrário, louvo a Deus e O engrandeço pelas maravilhas que operou em seus servos e em seu Divino Filho.

Se aos judeus na Lei Antiga, num tempo em que, quando se falava em imagens de escultura ninguém pensava em Jesus Cristo, nem em Maria Santíssima, nem nos santos, mas só nos ídolos, nos deuses falsos que eram adorados como se fossem o Supremo Senhor, se aos judeus no Antigo Testamento foi ou não proibido cultuar imagens por causa da excessiva inclinação que tinham para a idolatria, isto é lá com eles, não me interessa: não sou judeu; não sou do Antigo Testamento; nem sou tão estúpido que dê o mínimo valor à idolatria. Tenho que seguir a lei de Cristo que está exposta no Novo Testamento, em substituição à Lei Antiga que já foi abolida; e o Novo Testamento fala nos mandamentos de Deus, mostra-nos quais são, mas não contém nenhum versículo QUE PROÍBA FAZER IMAGENS SAGRADAS, NEM PRESTAR-LHES UM SIMPLES CULTO DE VENERAÇÃO.

Infelizmente, os protestantes, em vez de lerem a Bíblia como deveria ser, com o pensamento exclusivo de conhecer a verdadeira doutrina de Jesus, a lêem, primeiro que tudo, com a preocupação de ver em cada versículo um meio de fazer oposição sistemática à Igreja Católica, à qual votam um ódio indisfarçável. Já existe aí uma péssima preparação para chegar à verdade, porque o ódio cega.

E assim, em vez de ir buscar os mandamentos de Deus nos ensinos de Jesus Cristo, os vão buscar na Lei Antiga que foi dada aos judeus. E a imensa maioria deles caem logo numa grande contradição: se vão buscar os mandamentos na letra do Antigo Testamento para recriminar os católicos que têm imagens, por que motivo então não observam o sábado, como era preceituado na Lei Antiga? E todos caem nesta inconsequência: se o mandamento divino proibia, como eles querem, qualquer imagem ou figura, por que não saem pelo mundo afora bradando contra todas as estátuas, todos os quadros de pintura, todos os desenhos e todas as fotografias?

Portanto, das duas uma: Ou a proibição de fazer imagens e prestar-lhes culto, que está nos versículos 4.° e 5.° do capítulo 20 do Êxodo, se refere só aos deuses estrangeiros e, por conseguinte não nos atinge, a nós católicos, uma vez que as nossas imagens não são imagens de deuses estrangeiros; ou então é uma lei rigorosíssima, proibindo fazer qualquer imagem, qualquer figura ou semelhança, seja lá do que for, qualquer estátua, pintura ou gravura, e neste caso não pertence à lei natural, é uma lei positiva que faz parte apenas da lei mosaica e, portanto, também não nos atinge, porque não somos judeus anteriores a Cristo, nem estamos sujeitos à lei mosaica; e no Novo Testamento não há nenhuma proibição do culto das imagens tal qual nós o fazemos.

Estamos, sim, obrigados a não cometer nenhum ato de idolatria. Esta é uma lei natural escrita nos nossos corações; e uma lei cristã, constantemente pregada pelos Apóstolos, como por exemplo: “Nem os idólatras... hão de possuir o reino de Deus” (1 Cor 6, 9-10), e: “Meus caríssimos, fugi da idolatria” (Idem., 10, 14).

Mas o nosso culto às imagens está muito longe de ser uma idolatria, porque: 1.° Como já explicamos, as nossas imagens não são ídolos (ídolo é a representação de um deus falso); 2.° Não prestamos a elas o culto de adoração ou latria (pois isto seria reconhecer-lhes o supremo domínio sobre todas as coisas), culto este que só prestamos a Deus.

E, como já esclarecemos no princípio, este culto não é obrigatório no sentido de que só se salva quem rezar diante das imagens, ou que só se possa fazer oração diante delas. Mas a Igreja o conserva como um método utilíssimo para instruir os fiéis, para avivar sempre no espírito de todos, até mesmo dos mais rudes, a lembrança das coisas celestiais e para melhor fomentar nos seus filhos o fervor, a piedade e a devoção.

 

VIII

LICEIDADE E CONVENIÊNCIA

 

A FORÇA DAS CIRCUNSTÂNCIAS

 

Finalmente dirão os protestantes: O culto das imagens não consta absolutamente na Bíblia, por isto não o aceitamos. No Antigo Testamento não há nenhum vestígio desse culto. Os querubins, de que fala na Bíblia, eram para adorno do templo, não para serem cultuados. A serpente de bronze serviu para curar os que estavam feridos pelas serpentes (Nm 21, 8-9). Mas, quando os filhos de Israel começaram a queimar incenso diante dela, o rei Ezequias a fez em pedaços. E a Bíblia o louva por causa disto: “Ele fez o que era bom na presença do Senhor” (2 Rs 18, 3).

E no Novo Testamento não consta absolutamente, nem que Jesus, nem que os Apóstolos, nem que nenhum cristão mandasse fazer imagens ou a elas prestasse culto. Logo, o culto das imagens desagrada a Deus.

– Caros amigos: Uma coisa é não se fazer um ato porque é pecado, porque desagrada a Deus. E outra coisa muito diferente é não se fazer um ato porque em determinadas circunstâncias não é prudente, nem conveniente e pode tornar-se uma ocasião para o pecado.

É preciso ver a situação em que estava o mundo durante todo o tempo antes de Cristo. Todas as nações estavam mergulhadas na idolatria, adorando estátuas de deuses falsos, como se fossem o verdadeiro Deus, e apenas um pequenino povo adorava o Deus único, Invisível e Eterno.

Este pequeno povo, que era o povo hebreu, estava completamente cercado de nações idólatras e, além disso, tinha uma inclinação tremenda para a idolatria. Basta dizer que, depois de ter Deus manifestado tão estrondosamente a sua glória no monte Sinai, “o povo, vendo que Moisés tardava de descer do monte, se ajuntou contra Arão e disse: Levanta-te, faze-nos deuses que vão adiante de nós, porque não sabemos o que aconteceu a Moisés” (Ex 32, 1). E feito o bezerro de ouro, exclamava: “Estes são, ó Israel, os teus deuses que te tiraram da terra do Egito” (Idem., 32, 4).

Basta ler qualquer parte do Antigo Testamento para ver a facilidade com que o povo caía na idolatria, à qual não escapou, apesar de sua imensa sabedoria, o próprio rei Salomão.

Nestas circunstâncias, nesta situação tão delicada, Deus tinha um cuidado todo especial em evitar qualquer coisa que, mesmo de longe, pudesse dar ocasião a que os judeus se entregassem àquele culto dos ídolos, a que eram tão fortemente inclinados. Por isso tinha que privar a este povo e, se assim se pode dizer, privar-se a si mesmo de coisas que eram lícitas, que eram justíssimas, que eram santas, para evitar o perigo da idolatria.

Por exemplo: Nada mais justo, nada mais lícito, nada mais santo do que Deus instruir os homens a respeito de sua própria natureza, revelar as suas grandezas e perfeições. Era proibido Deus revelar aos judeus que havia n’Ele três pessoas distintas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo constituindo um só Deus Verdadeiro? Absolutamente não. Mas não quis revelar o mistério da Santíssima Trindade, que durante tantos séculos ficou oculto à humanidade, simplesmente por isto: os judeus não tinham capacidade para receber esta revelação e, ouvindo falar na Trindade, iriam logo fazer confusão com o politeísmo das outras nações. Os gentios adoravam a muitos deuses e eles ficariam também com a ideia de que havia três deuses. Com a era do Cristianismo, este viria renovar completamente a face da terra, e o mundo já estaria em condições de ter notícia da Santíssima Trindade, a qual foi revelada por Nosso Senhor Jesus Cristo.

Outro exemplo: Deus, quando se revelou no monte Horeb, podia ter-se manifestado sob uma forma sensível, sob a aparência de alguma coisa material? Sim, podia. Tanto podia que se encarnou em Jesus Cristo homem e viveu aqui na terra trinta e três anos. Tanto podia que o Espírito Santo apareceu em forma sensível: “E desceu sobre Ele o Espírito Santo em forma corpórea, como uma pomba” (Lc 3, 22), e: “E lhes apareceram repartidas como línguas de fogo, que repousou sobre cada um deles e foram todos cheios do Espírito Santo” (At 2, 3-4).

Entretanto, Deus, ao revelar-se no monte Horeb não tomou nenhuma forma sensível para se manifestar e, se assim procedeu, não foi porque isto fosse ilícito, mas para evitar aos judeus o perigo da idolatria: “Vós não vistes figura alguma no dia em que o Senhor vos falou em Horeb do meio do fogo, por não suceder que enganados façais para vós alguma imagem de escultura ou alguma figura de homem ou de mulher, nem semelhança de qualquer animal que há sobre a terra ou das aves que voam debaixo do céu, ou dos répteis que se movem na terra ou dos peixes que debaixo da terra moram nas águas; não seja que, levantando os olhos ao céu, vejas o sol e a lua e todos os astros do céu e, caindo no erro, adores e dês culto a essas coisas que o Senhor teu Deus criou para serviço de todas as gentes que vivem debaixo do céu” (Dt 4, 15-19).

Hoje é muito comum colocar-se na rua as estátuas dos grandes homens, dos grandes heróis da nossa Pátria e, em certos e determinados dias, prestar-se uma homenagem à memória destes homens, cobrir de flores suas estátuas, fazer-se discursos etc. Isto é muito lícito e muito natural e nestas manifestações públicas feitas a um homem perante a sua estátua, o que é o mesmo que dizer, perante a sua imagem, tomam parte também os próprios protestantes, como cidadãos e patriotas que são, porque sabem muito bem que nisto não há nada demais, que aí não há nenhuma idolatria.

Pois bem, esta mesma cena realizada outrora no seio do povo judaico, seria completamente inconcebível. Terem os judeus nas praças públicas: estátuas de Abraão, de Isaac, de Jacó, de Moisés... e prestar-lhes homenagens, cobri-las de flores – não se consentiria de forma alguma. Por quê? Por que era ilícito? Se é lícito hoje, também o podia ser naquele tempo. Isto não se consentiria porque seria uma grandíssima imprudência; o povo não estaria em condições de bem compreender o sentido de tais homenagens e aquilo fatalmente iria dar numa indébita adoração à criatura, pecado este de que o mundo estava cheio naquela época.

Por isto se explica muito bem o fato de não ter havido entre os judeus nem o culto dos santos nem o culto das imagens. O povo não tinha capacidade para distinguir entre uma simples veneração e a adoração propriamente dita.

Foi natural, portanto, o gesto de Ezequias. Se os judeus soubessem que aquela serpente de metal era figura do Messias, Jesus Cristo Salvador Nosso, pendente da sua cruz e queimassem incenso diante dela exclusivamente com o pensamento de homenagear, através do sou símbolo, Aquele que havia de morrer por nós para nos salvar do pecado, assim como a serpente de bronze curara a muitos de seus ferimentos, Deus não se incomodaria com isto, porque Ele só podia achar justa, santa e razoável uma homenagem prestada a seu Divino Filho.

Mas não era nem podia ser com este pensamento que os judeus queimavam o seu incenso; aquilo, se já não era idolatria, estava arriscado a sê-lo. Por isso, foi preciso fazer desaparecer a serpente de metal, que, aliás, o próprio Deus tinha mandado fazer.

Ora, não foi num dia que o paganismo idólatra deixou de dominar o mundo. A substituição do paganismo pelo Cristianismo foi-se processando progressivamente no decorrer de alguns séculos. E no tempo em que viviam os Apóstolos a situação era praticamente a mesma que tinha existido antes de Cristo; o mundo ainda estava mergulhado na idolatria. Aparecerem os Apóstolos mandando fazer imagens de Jesus Cristo e reverenciá-las, seria a maior das imprudências; uma vez que, como explicamos, este culto não é necessário para a salvação, mas apenas um método, um meio para instruir, para excitar à devoção... a imagem naqueles tempos seria totalmente contraproducente. Não só causaria repugnância aos judeus, mas iria fazer uma confusão tremenda na cabeça dos pagãos, os quais não lhe saberiam compreender o verdadeiro sentido e pensariam que, à semelhança deles, os cristãos também tinham seus ídolos.

 

IX

AS IMAGENS ATRAVÉS DOS SÉCULOS DA ERA CRISTÃ

 

O uso das imagens tinha que vir aparecendo, portanto, pouco a pouco, de acordo com as circunstâncias. Daí se explica, por exemplo, que os primeiros cristãos não tivessem imagens nas suas igrejas abertas ao público, que, aliás, não eram numerosas naqueles tempos de tremenda perseguição, como foram os três primeiros séculos da nossa era. Não só as imagens e símbolos serviriam para denunciá-los, como também podiam ser mal interpretados pelos pagãos que os vissem, os quais poderiam pensar que os cristãos apenas tinham mudado de ídolos. Daí também ser no princípio, restrito, o uso às imagens pintadas, para depois se passar às imagens de escultura.

Mas que as imagens, pelo menos de pintura, tenham sido usadas pelos cristãos dos primeiros séculos, não há dúvida alguma.

Temos o testemunho valioso das catacumbas de Roma. Ali naqueles subterrâneos, que eram lugares também de culto coletivo, longe das vistas dos pagãos podiam os artistas cristãos entregar-se mais livremente à sua tarefa de reproduzir os personagens e os mistérios do Cristianismo. E assim é comum nas catacumbas encontrarem-se imagens em pintura do Bom Pastor, de Maria Santíssima e de alguns santos (entre os quais predomina São Pedro, que era muito conhecido em Roma, onde se estabeleceu e sofreu o martírio). Algumas destas imagens dão indícios de pertencerem ao 1.° e ao 2.° séculos; e outras em grande número são pertencentes com toda certeza aos séculos 3.° e 4.°.

A Virgem Maria é quase sempre representada com seu Divino Filho nos braços, e a sua imagem mais antiga conhecida remonta no máximo à metade do século 2.°; encontra-se na Capela Grega das Catacumbas de Priscila. A Virgem aparece juntamente com os três Magos. Há outra imagem muito célebre, que tudo indica remontar a fins do século 2.°, em que aparece a Virgem sentada com o Menino nos braços, vendo-se ao seu lado Balaão apontando para uma estrela. Outra figura de Maria, da metade do século 4.°, apresenta-a como orante de braços estendidos diante de seu Divino Filho e se encontra no fundo de um arcossólio no Cemitério Maior. Isso mostra não só o uso das imagens, mas também o apreço que os cristãos sempre tiveram à mãe do Salvador.

As estátuas ou esculturas já são frequentes em sarcófagos do século 4.° e do 5.°; e há nas catacumbas, pelo menos, duas estátuas do Bom Pastor que parecem ser anteriores à época de Constantino (portanto, no máximo, do século 3.°).

Passando o testemunho das catacumbas para o dois livros, como autores que testemunham a existência de imagens, temos no século 3.° Tertuliano que fala no Bom Pastor representado nos cálices (De pudicitia VII, 10) e o historiador Eusébio de Cesaréia, que diz ter visto imagens pintadas de Jesus Cristo, de São Pedro e de São Paulo (História Eclesiástica VII, 18).

Uma vez conseguida a paz no tempo de Constantino (313), passando o Cristianismo a usar da liberdade de culto no Império Romano, vai-se espalhando por toda a parte o culto à cruz, principalmente depois que a rainha Helena, mãe de Constantino, encontrou a verdadeira cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, a qual, no meio das outras, demonstrou a sua autenticidade por meio de um milagre; e à proporção que se vai extinguindo o paganismo e, portanto, desaparecendo o perigo da confusão que poderia surgir entre os ídolos pagãos e as venerandas imagens de Jesus Cristo, da Santíssima Virgem e dos santos, vão aumentando em toda a parte, pública e privadamente, o uso e o culto das imagens.

Que do século 5.° em diante já se começam a usar profusamente não só nas casas particulares, mas também nas igrejas públicas, e não só imagens pintadas, mas também esculturas, isto é um fato incontestável.

Quando aparece no século 8.° a heresia dos iconoclastas ou quebradores de imagens, fomentada pelos imperadores bizantinos, é logo condenada pelo 2.° Concílio de Nicéia reunido em 787. E é de notar que este Concílio apela, em favor do culto das imagens, para a tradição da santa Igreja Católica; ao mesmo tempo em que acusa os iconoclastas de quererem introduzir uma novidade indo de encontro às tradições eclesiásticas. Isto mostra como era antigo na Igreja este culto: “Devem expor-se as venerandas imagens sacras, manufaturadas com tintas, com mosaico e com outras matérias idôneas nas igrejas consagradas a Deus, nos vasos e paramentos sagrados, nas paredes e nos retábulos, nas casas e nas ruas; e isto aplica-se tanto à imagem de Nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo e à de Nossa Senhora Imaculada, a santa Theotokos, como às imagens dos veneráveis anjos e de todos os homens santos e piedosos” (Horos, em: Mansi XIII, 377D).

Se o Imperador Carlos Magno entendeu, por razões políticas, de fazer coro com os imperadores bizantinos e isto produziu certa agitação no seio dos francos, a Igreja fez cessar esta perturbação com outro Concílio, o 4.° Concílio de Constantinopla (869 e 870) em que reafirmou e redefiniu o que já havia sido determinado no 2.° Concílio de Nicéia.

Do 2.° Concílio de Nicéia até os nossos dias, continuou cada vez mais propagado na Igreja Católica o culto das imagens. Aí estão os documentos históricos, os museus, as igrejas antiquíssimas da Europa para atestá-lo. E a prova é esta: por que os protestantes, aparecendo no século XVI, faziam tanta gritaria contra o culto das imagens, provocando assim um novo pronunciamento no Concílio de Trento, senão porque este culto continuava a existir na Igreja Católica.

Sobre os iconoclastas, escreve o Papa João Paulo II: “O movimento iconoclasta, rompendo com a tradição autêntica da Igreja, considerava a veneração das imagens como um retorno à idolatria. Não sem contradição e ambiguidade, ele proibia a representação de Cristo e as imagens religiosas em geral, enquanto continuava a admitir as imagens profanas, em particular as imagens do imperador, com os sinais de reverência que a elas andavam ligados” (Carta “Duodecim Saeculum”, 8).

 

X

O FEITIÇO CONTRA O FEITICEIRO

 

De modo que os protestantes, quando dizem que o culto das imagens é uma idolatria; quando dizem que se há este culto é simplesmente porque o paganismo invadiu a Igreja, mostram apenas que não CRÊEM EM NOSSO SENHOR JESUS CRISTO.

Jesus Cristo fundou a sua Igreja e prometeu que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei A MINHA IGREJA, E AS PORTAS DO INFERNO NÃO PREVALECERÃO CONTRA ELA” (Mt 16, 18). Bem como mandou seus Apóstolos propagarem uma igreja universal: “Ide, pois, ensinai todas as gentes” (Idem., 28, 19), e prometeu sua proteção, sua assistência até o fim do mundo: “Estais certos de que eu estou convosco todos os dias, até a consumação do século” (Idem., 28, 20).

Como é que deixou esta Igreja Universal ficar durante mais de 1.000 anos praticando a idolatria, invadida por um grosseiro paganismo... e só no século XVI fez aparecer Calvino para remediar a esta situação? Neste caso, então a Palavra de Nosso Senhor Jesus Cristo não seria infalível.

A Igreja é a amada esposa de Cristo (Ef 5, 25). Não se pode lançar sobre ela a gravíssima acusação de haver-se prostituído pela idolatria, sem ultrajar ao mesmo tempo o seu Divino Esposo que, tendo poder infinito, tão explicitamente prometeu velar sobre ela até a consumação do mundo.

Lembre-se protestante, de que é preciso, porém, ler a Bíblia toda, com discernimento e sinceridade. Com versículos recortados todas as monstruosidades encontrarão apoio na Sagrada Escritura.

 

 

Martinho Lutero: Pai dos Protestantes

 

Dizia Martinho Lutero: “Os evangélicos são sete vezes piores que outrora. Depois da pregação da nossa doutrina, os homens entregaram-se ao roubo, à mentira, à impostura, à crápula, à embriaguez e a toda a espécie de vícios. Expulsamos um demônio e vieram sete piores. Príncipes, senhores, nobres, burgueses e agricultores perderam de todo o temor de Deus”.

Obs.: O demônio que ele dizia ter expulsado era o Papado.

 

 

 

 

 

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Depois de autorizado, é preciso citar:

Pe. Divino Antônio Lopes FP. "Deus manda fazer imagens"

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